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Mudar a região

Editorial

Há 16 anos, com o José Luís Carrilho de Almeida, iniciámos um projeto editorial ambicioso. Queríamos «dar vida ao interior» e contribuir para uma metamorfose na região.

Então, estranhamente, o distrito da Guarda e a Cova da Beira estavam completamente de costas – nada se sabia de um lado sobre o outro; a Guarda e a Covilhã tinham inclusive uma estranha rivalidade e um completo desconhecimento uma da outra. Não havia A23 e as curvas e contracurvas aumentavam a dimensão da distância. Mas, contrariando as circunstâncias da mudança de milénio, o projeto editorial que liderámos, pretendeu a aproximação e promoção de uma região com interesses comuns. Se no ano anterior a regionalização tinha sido referendada negativamente e a Beira Interior tinha sido humilhada pelos dois lados – um por oposição ao outro – nós apostámos e contribuímos para a metamorfose. E contribuímos decisivamente para a mutação social e inter-regional que se registou ao longo de 16 anos, e que a emergência da CIM Beiras e Serra da Estrela confirma.

Repassar o tempo, o nosso tempo, é recordar o quanto a região se transformou em pouco mais de uma dúzia de anos; e é também visitar os arquivos e reler o que se disse ao longo dos anos, o que diziam os protagonistas da história regional, o que respondiam os políticos às milhentas questões colocadas. Ou perceber como alguns mudaram de opinião e outros nem tanto. E que a maior das mudanças foi a tragédia demográfica que se abateu sobre a região, sobre todo o interior, ao longo dos anos de que somos testemunha – os milhares de pessoas que partiram destas terras que agora se transformam em territórios inóspitos, de «baixa densidade», abandonados e moribundos. Porque o que é verdadeiramente transversal aos 16 anos deste jornal é o registo do fim de empresas, da fuga das pessoas, do desalento de todos, da falta de compromisso para o futuro.

Em 16 anos, O INTERIOR é o único jornal do distrito da Guarda agraciado com o Prémio Gazeta de Imprensa Regional; fomos escolhidos por Pinto Balsemão para integrarmos a Rede Expresso, com o maior semanário português, de que continuamos a ser parceiros; organizámos as “Festas do Livro da Guarda”, entre 2002 e 2008, naquela que era a maior feira de livros do interior e uma singela e entusiasmante festa de cultura, do livro e da leitura. Organizámos debates públicos e fóruns sobre a regionalização, sobre as autárquicas, sobre empresas, sobre saúde… sobre o presente e o futuro. Enfim, atrevemo-nos a intervir na comunidade, informando, mas também sendo parte ativa no processo de mudança. Como diria Sophia de Mello Breyner Andersen, “Vemos, Ouvimos e Lemos / Não podemos ignorar” e por isso mantivemos um rumo sem tergiversar: informar, interrogar, denunciar, opinar livremente, promover o desenvolvimento, mesmo quando tantos ficam contra nós.

Num tempo de crise, de enormes dificuldades, numa região onde o mercado implodiu e o futuro que vislumbramos é demasiadamente imediato e sombrio, continuamos apostados, como há 16 anos, em afirmar o nosso projeto editorial, com dedicação e muito esforço, mas acreditando que vale a pena e que os nossos leitores merecem essa entrega e determinação.

Luis Baptista-Martins

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