O engº. Mira Amaral, face ao artigo publicado por Luis Baptista Martins n’ O INTERIOR, de 3 de novembro, sobre o “o enriquecimento dos políticos”, remeteu ao nosso jornal a carta-resposta que enviou ao jornalista António Sérgio Azenha, autor do livro citado.
Estou verdadeiramente chocado com a inclusão do meu nome no livro que acabou de escrever.
É que a sua análise sofre dum grave erro metodológico. Com efeito, a sua análise sobre rendimentos deveria incidir sobre a totalidade da vida profissional, antes e depois do governo e não apenas a comparação entre o que se recebia no governo e depois do governo. Comparar o magro vencimento que tinha no governo em 1994 com um vencimento perfeitamente “normal” num grupo privado em 2001 é comparar alhos com bugalhos. Recordo-me aliás do meu colega Engº Alves Monteiro no dia em que saiu comigo do governo e regressar ao Banco de Fomento como Diretor duplicar o vencimento em relação ao que ganhava como meu Secretário de Estado da Indústria!
É que eu já trabalhava antes de ir para o governo. Fui quadro da EDP e do Banco de Fomento e quando cheguei ao governo já tinha 16 anos de vida profissional. E toda a gente sabe que no governo se ganha menos do que na vida empresarial, onde já estava antes de ter tido essa infeliz ideia.
Se tivesse feito uma análise dinâmica desse tipo, começando pela minha vida profissional antes do governo, concluiria facilmente que só perdi dinheiro com a passagem pelo governo.
Se tivesse comparado a minha posição profissional antes de entrar no governo com a de outros colegas meus nessa altura e depois verificasse a evolução deles, concluiria facilmente que aquilo que auferi depois do governo teve um atraso e no fundo foi inferior ao desses colegas. A dinâmica profissional que tive depois do governo não se deveu pois apenas a este mas sim às minhas competências e, como referido, nem sequer consegui obter posições idênticas às desses colegas que tiveram o bom senso de não aceitarem cargos políticos.
Ao sair do governo, regressei ao meu banco de origem, aquele em que estava antes, o qual foi depois comprado pelo Grupo BPI e onde cheguei a Administrador. Não andei, pois, como gestor público em empresas públicas.
Tive depois a infeliz ideia de ir ajudar o governo na CGD, onde perdi dinheiro em relação ao pacote financeiro que tinha no BPI, tendo sido aí enxovalhado e vigarizado pelos governos PSD/PP. Aí nesses dois anos como gestor público ganhava menos do que auferia no sector privado.
Reformei-me da CGD, ao abrigo do regime de pensão unificada, para o qual contaram as contribuições que fiz ao longo de 38 anos de carreira contributiva para a Segurança Social e para a Caixa Geral de Aposentações. Esse é o erro factual do seu texto pois a minha reforma não é devida apenas aos dois anos da CGD mas sim aos 38 anos de carreira contributiva para a qual contam obviamente os dois anos da CGD.
Infelizmente, a minha reforma não é de 18.000 euros, como diz, mas sim de 11.000 euros. Se não tivesse ido para a CGD, ter-me-ia reformado como Administrador do BPI com 10.000 euros, apenas menos mil euros! Como vê, fui mais uma vítima duma especulação e de uma pulhice inqualificável desse senhor Bagão Félix.
Ao contrário de outros, alguns referidos no livro, eu não conheci a banca e a energia depois do governo. Já lá estava antes.
Ao contrário do que o inqualificável pulha Bagão Félix diz, a minha reforma, pelos factos que lhe expliquei, não é pornográfica mas serão pornográficas duas situações de dois amigos dele:
A do jovem Paulo Teixeira Pinto que se reformou do BCP aos 49 anos com cerca de 35.000 euros mês (!) tendo recebido de indemnização, ao que dizem, 10 milhões de euros. Só conheceu a banca depois do governo…
A de Vítor Martins, amigo do Bagão Félix, que este colocou como presidente da CGD, sem nunca antes ter trabalhado num banco, e que saiu de lá ao fim de um ano com 900 mil euros de indemnização, como o “DN” noticiou na altura!!
Em suma, aquilo que diz sobre mim é fatualmente correto com exceção da explicação da minha reforma, obtida pela legislação aplicável a qualquer cidadão nas minhas condições, mas enferma do grande erro metodológico de não ter começado a análise antes da minha ida para o governo, e de não fazer uma comparação com as dinâmicas profissionais de colegas meus que não tiveram o azar de ir para o governo.
Não sou rico, sempre vivi do meu trabalho, não enriqueci com a passagem pela política, antes pelo contrário, mas obviamente que com o seu livro sou mais uma vez metido muito injustamente na classe dos que enriqueceram com a política. Cada dia que passa, mais me arrependo de lá ter passado. Não sou um político mas sim um quadro técnico que serviu transitoriamente o país em funções políticas.
(…)
Espero que compreenda este desabafo de quem nunca se serviu dos cargos públicos, antes pelo contrário, mas que, como não foi servil nem “yes-man” do cavaquismo e do bloco central político-financeiro que manda no país desde o governo Guterres, foi enganado, enxovalhado e vítima duma vil e infame campanha com vista ao seu assassinato mediático por parte de Bagão Félix, do cavaquismo e desse bloco central político-financeiro. Infelizmente não sou rico, apenas pertenço a uma classe média que sempre viveu do seu trabalho.
Luís Mira Amaral, Lisboa