O ensino das línguas sofreu grandes mudanças ao longo do século XX, afastando-se da metodologia “tradicional” que reinava desde o fim do século XVIII. Este método privilegiava exclusivamente a aquisição/aprendizagem da gramática tradicional e a tradução. Obrigava ainda à memorização de listas exaustivas de palavras e, tal como no ensino da língua materna (LM), baseava-se no estudo da escrita e do texto literário. Assim, a tradução e a retroversão desempenharam um papel importante no ensino/aprendizagem da LE, dentro da sala de aula, tal como sucedia no ensino do latim e do grego. De facto, a LE era ensinada como se se tratasse de uma língua morta. Esta semelhança no ensino das línguas vivas e das línguas mortas deveu-se, na opinião de Maria José Frias, à ausência de tradição no ensino da LE e à falta de formação do pessoal docente, no início, que tendia a reproduzir a sua própria formação.
No início do século XX, a metodologia “tradicional” deixou finalmente de dominar o ensino/aprendizagem da LM e das LE’s devido a pressões políticas, económicas e turísticas. O ensino da LE, como instrumento de comunicação, tornou-se então, na opinião da autora (1992), a grande prioridade, «preconizando o primado da língua oral e o acesso “directo” ao código estrangeiro.» O método “directo” marca, assim, uma primeira ruptura com a metodologia anterior: o professor de LE rejeita, então, a LM de forma a poder colocar o aluno num “banho de língua” e proporcionar-lhe uma aquisição o mais “natural” possível da LE, para além de proceder à explicação de textos na própria LE.
A partir dos anos 50, o ensino da LE sofreu ainda grandes mudanças graças ao surgimento de duas concepções internacionais que vieram modificar o ensino/aprendizagem da LE: a metodologia audio-oral ou audiolingual, nascida nos Estados Unidos e a metodologia audiovisual, nascida na Europa. Estas duas concepções, apresentando algumas características comuns, trouxeram consequências decisivas, a nível internacional, na evolução das relações entre a LE e a LM no ensino. As metodologias audiovisuais revelam semelhanças com as metodologias audio-orais na medida em que conduzem também a uma separação radical entre os ensinos da LM e da LE : a LM era vista como prejudicial, causadora de erros e perigosa fonte de interferência, já que os alunos têm tendência a transpor para a LE a morfologia e a sintaxe da sua LM. Pensava-se erradamente que a pedagogia audiovisual baniria as interferências. De facto, quando o aluno vê um objecto na imagem, nomeia-o primeiro interiormente na sua LM e, só depois, estabelece uma equivalência entre o nome dado em LM e o nome que lhe dá o professor na LE. Esta prática obriga, portanto, o aluno a passar pela sua LM ao contrário do que se pretendia.
Neste sentido, acreditamos que, ao adquirir uma capacidade reflexiva sobre o sistema linguístico, os alunos poderão fazer interagir de forma articulada as suas aprendizagens de LM e LE ultrapassando, deste modo, o fosso entre a LM e LE. Como tal, a Análise Contrastiva parece-nos deveras importante enquanto processo de prevenção de possíveis erros, mas sobretudo enquanto abordagem integradora dos sistemas linguísticos.
Nesta sua obra, Maria José Frias debruça-se, portanto, sobre o campo da relação LM-LE e da “pedagogia intercultural”, tornando-se um ponto de referência importante para quem deseje aperfeiçoar os seus conhecimentos sobre o assunto. De facto, faz a descrição das relações existentes entre os ensinos da LM e da LE até aos anos 70, analisa as origens e desenvolvimentos da reflexão sobre a problemática das relações LM-LE e estuda a articulação e o enriquecimento de uma pedagogia da comunicação em LM e em LE.
Por: Manuela Perestrelo