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Lana Turner

Opinião – Ovo de Colombo

Lana Turner foi um ícone indissociável do glamour no cinema. Não tinha o mistério de Garbo, a beleza exótica de Gardner ou o talento de Bergman. Transbordava, contudo, glamour, esse conceito que o cinema norte-americano da era clássica produziu como ninguém. Não é uma diva muito lembrada hoje (quase nenhuma é). E se há uma loira glamorosa por excelência do cinema, essa é Marilyn Monroe. Porém, a minha favorita é Lana Turner. Não sei bem por que razão. O que posso afirmar objetivamente é que é das estrelas mais interessantes de serem estudadas (ela, sim, deve ser chamada de estrela, visto, a par de Joan Crawford, ter percebido na perfeição o seu significado). No seu primeiro filme, “They Won’t Forget” (Mervyn LeRoy, 1937), Lana é quase figurante. O que ela faz é pouco mais que atravessar uma rua. Acontece que bastou esse momento banal para que a jovem se tornasse um “sex symbol” nos EUA, não levasse ela, na sua inocência, um sweater ajustado ao corpo. O furor foi tal que a loira passou a ser apelidada de “Sweater Girl”. E é aqui que reside a essência da Lana como “sex symbol”. Marlene Dietrich é também um ícone sexual, porém quase etéreo. Já Lana, mulher terrena, é a vizinha sexy por excelência.

Richard Dyer afirma que Lana, através do “sweater”, uma camisola vulgar que toda a gente compra, anulou a oposição explorada pelo cinema entre sexy e exótico vs assexuado e caseiro, comum. Reparemos em “The Postman Always Rings Twice” (Tay Garnett, 1946), o seu filme mais conhecido. Nele, Lana, na sua beleza vulgar, mostra-se sensual nas suas roupas modestas e consegue por “glamour” no ato de lavar pratos, tarefa que não está associada convencionalmente a tal atributo.

Dyer deteta ainda uma estreita relação entre os filmes de Lana e a sua própria vida pessoal. “Ziegfeld Girl” (Robert Z. Leonard, 1941) é um bom exemplo: na vida real, Lana, de origens muito humildes, num momento em que faltou às aulas para ir tomar uma Coca-Cola num café, é vista por um caça talentos e, desde então, nunca mais deixou de ser estrela; em “Ziegfeld Girl”, a sua personagem, uma rapariga pobre de Brooklyn, também vira estrela do “show business” por pura sorte. Tal como os filmes de Crawford, os de Lana seguem frequentemente a lógica Cinderela com a diferença de que a loira não esfrega o chão até “lá chegar”.

Quando atores mais jovens começaram a encantar Hollywood (Marlon Brando, Marilyn Monroe etc.), Lana, que via os seus tempos de “sex symbol” deixados para trás, conseguiu encontrar um novo modelo na sua carreira, isto é, de “femme fatale” passou a mulher rica em melodramas e, nesta linha, “Peyton Place” (Mark Robson, 1957) rendeu-lhe a única nomeação ao Óscar de melhor atriz. Infelizmente este seu reinado durou pouco. Com a sua despedida do cinema, ficou uma era alimentada pelo “glamour” e pela beleza. Lana, que casou sete vezes como a sua amiga Elizabeth Taylor, disse certa vez que gostaria de acreditar que tivesse ela própria «ajudado a preservar o “glamour” e a beleza e o mistério da indústria cinematográfica». Ela não contribuiu; ela fez mais que ninguém. Conseguiu ainda, com o tempo, ser uma atriz competente. Mas a ser uma estrela, ela aprendeu depressa. E brilhou sempre.

Miguel Moreira

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