Há, de facto, realidades que nos perturbam e nos deixam de boca fechada, pois, a abri-la, seria para nos insurgirmos contra um sistema que não entendemos, transcendente, amplamente perturbador.
Há dias, aquando da minha matrícula para mais um ano lectivo na Escola Superior de Educação da Guarda (…), assisti a um episódio cujo impacto vou deixar avaliar aos leitores.
À minha frente estava uma jovem simples (…) e compactada na apreensão daquela primeira ida à Escola Superior. Com ela veio a mãe, uma senhora pacata, cujas agruras da vida se liam no áspero das mãos (…). No momento da inscrição para a matrícula e quando o funcionário disse que a primeira prestação era paga naquele instante, aquela senhora, que ali combatia com um espaço que não era o seu, deixou que a filha lhe dissesse, com uma voz fina, dissipada na vergonha e afundada num nervosismo que me obrigou a olhar para o chão, (…) para tentar, eu mesmo, desaparecer dali, que a quantia a despender eram 250 euros.
Abateu-se então sobre ela um misto de pânico e tristeza, de quase desonra. Trémula e reticente nas palavras, a senhora disse para a filha, que também sentia e expressava a miséria e as dificuldades de uma família: «Vamos embora, eu não tenho dinheiro para te deixar estudar».
Num gesto entorpecido, no meio de um silêncio aterrador, a jovem não contestou as palavras da mãe. Cabisbaixa, com os cabelos a ocultar-lhe o rosto suave, mas fustigado pela tristeza e por um constrangimento que queria esconder, retirou-se juntamente com a mãe destroçada. O olhar daquela senhora resplandecia cristalino, brilhante como o oceano ao entardecer…
Meu Deus, o que se passa neste mundo? Neste país? Aqui mesmo à nossa volta? Sabem do que falam os jornais? Da fortuna de José Mourinho… É triste e dá nojo.
Fernando Luís Janela Birra, trabalhador-estudante, Guarda
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