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Javier Marías: nome incontornável da literatura ibérica

Opinião – Ovo de Colombo

Passeando pelos escaparates de uma livraria, em busca de algo novo e diferente para ler, encontrei um livro cujo título me despertou a atenção: Os Enamoramentos, de um autor espanhol contemporâneo que desconhecia de todo, Javier Marías.

Na capa, uma foto a sépia, de um casal estilo anos 50 a dar um beijo. Na contracapa do livro uma síntese. Nas badanas, comentários de imprensa ao autor: “um dos maiores ficcionistas da nossa época”, um “sério candidato ao Nobel”, o “maior nome da literatura europeia”. Elogios excessivos, talvez, não fossem assinados por nomes como os de J. M. Cotzee ou Orthan Pamuk, e publicados em jornais de referência como El País. Trouxe o livro comigo e li-o de um trago como quem bebe um refrescante copo de água numa tarde canicular de agosto.

Javier Marías, escritor e ensaísta espanhol de 60 anos, é o mais celebrado autor da literatura espanhola contemporânea e este seu último romance, vindo a público em 2011, foi sucesso imediato na Amazon espanhola, com mais de 200 mil exemplares vendidos em Espanha, Alemanha e Holanda, tendo sido laureado com o Prémio Europeu de Literatura em 2011.

Narrado na primeira pessoa por uma narradora homodiegética, Os Enamoramentos conta-nos muito mais do que uma história de amor: oferece-nos uma viagem ao interior dos sentimentos mais complexos do ser humano, como a sua experiência do amor, da morte e da amizade. Com uma linha narrativa aparentemente muito simples, esta obra conta a história de uma solitária editora madrilena, María Dolz, que todos os dias admira à distância um casal perfeito aos seus olhos, na esplanada de uma cafeteria, antes de iniciar a sua rotina diária. A morte violenta e inesperada do empresário Desvern põe fim ao “casal perfeito”, objeto de adulação da narradora, mas condu-la a uma imersão pelos recônditos lugares da mente humana. De espectadora, María torna-se personagem, ao envolver-se com o melhor amigo do falecido, numa relação que lhe vai permitir apreender as antíteses das paixões: amor / ódio; amizade / traição; vida / morte; presença / ausência.

Num diálogo muito vivo com a narrativa de Balzac Le Colonnel Chabert, esta narrativa convida-nos a refletir também sobre a morte e o efeito que a perda de entes queridos pode ter para a desconstrução ou reconstrução do nosso mundo.

Obra admirável pela capacidade de envolver o leitor através da construção de personagens fortes e espessas com quem passeamos, durante cerca de 380 páginas, pelas labirínticas ruelas da paixão humana.

Ana Teresa Peixinho*

*Professora da Universidade de Coimbra

Próxima semana: João Gonçalves (troca pontual com Fernanda Fernandes)

Sobre o autor

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