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Já está! Foi limpinho, limpinho

Acabou. Conseguimos. Não, não me refiro ao título do Benfica, apesar de também ter sido limpinho. A troika vai embora e nós conseguimos uma saída limpa. À irlandesa, como se diz. Se a saída do programa de assistência económica e financeira é, dizem-nos, imaculada, a saída da troika de Portugal não é bem assim. Já lá iremos.

Antes, importa perceber o que é a saída, dita, limpa. E o porquê do sucesso do Processo de Revolução [ainda] em Curso e de não se saber para quando o seu término. A saída sem recurso a outro empréstimo ou a um programa cautelar acontece, essencialmente, devido a três razões: a) a desconfiança dos investidores face aos países emergentes acabou por resultar na baixa generalizada dos juros exigidos aos países europeus da periferia; b) uma declaração do presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, garantindo apoio aos países em dificuldade, reduziu o receio em torno da viabilidade do euro; c) os países do Norte da Europa não estão disponíveis, a um mês das eleições europeias, para disponibilizar novo empréstimo. Eleitoralismo é mal comum. Até na Grécia já se fala em saída limpa!

Até agora tudo correu bem, dizem. O programa da troika foi cumprido com sucesso, insistem. E é verdade. A troika e o executivo de Passos Coelho tinham como objetivo reorganizar a estrutura socioeconómica de Portugal. Para tal pretendia-se baixar o preço do fator unitário de trabalho (salários), reduzir o valor das reformas e, assim, garantir o abaixamento genérico das condições de vida dos portugueses. Missão cumprida e balança comercial estabilizada. À custa de demasiado sofrimento, mas que importa quando confrontados com o tamanho sucesso político a que Pires de Lima já chamou “milagre económico”? Importa tudo, porque o que foi conseguido é, essencialmente, conjuntural. De estrutural apenas o empobrecimento e a terra queimada para décadas. Já a reforma do Estado, cuja apresentação vem sendo adiada há mais de ano e meio, abrilhantada pelo documento mal-amanhado de Paulo Portas, está, como disse o vice-primeiro-ministro na semana passada, para “breve”.

Para já fica-se com a reformulação do modelo em que assentava a sociedade, finalmente sem poder de compra para viver de acordo com as possibilidades. Mesmo que nenhumas. Mas apesar de bem encaminhado não terminou. Por isso há novos impostos. Eterniza-se o definitivo provisório. A mentira ganha uma relatividade também ela provisória. Porque não é mentira quando ninguém acredita. É, apenas, irrelevante o que é dito.

E com o processo a seguir o seu curso, percebe-se que a troika não sairá. Ficará de fininho. Os credores não saem sabendo da impossibilidade das lunáticas taxas de crescimento do PIB, previstas por Passos Coelho, se verificarem. Portanto não querem correr riscos da transformação operada ser adulterada. Por isso este domingo já se escrevia sobre uma “carta de intenções” que o FMI exigiu para a tal saída limpa. Limpinha, mas com caderno de encargos. Encargos que vão recair sobre os mesmos de sempre. Limpinho!

Por: David Santiago

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