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Haja moral

Editorial

1. “À mulher de César não basta ser honesta, tem de parecer honesta”. A expressão surgiu após um escândalo em Roma, por volta de 60 a.C. Rezam as crónicas que Pompéia, mulher de César, tinha um nobre admirador, chamado Clódio. O jovem romano, num certo dia, disfarçou-se de mulher para entrar no palácio do Imperador e perdeu-se. Foi encontrado pelos guardas e foi levado a tribunal, pois em causa estava a honorabilidade da mulher de César e do próprio Imperador de Roma. Nada se provou – nem contra o jovem, nem contra a mulher de César. O suposto amante foi absolvido. Mas o Imperador, apesar de ter mostrado confiança na integridade de Pompéia, passou a repudiá-la. Questionado posteriormente por ter agido de forma tão contraditória, o ditador romano explicou o seu procedimento: não basta que a mulher de César seja honrada; é preciso que nem sequer seja suspeitada.

Este conto, tantas vezes recordado (ou pelo menos a conclusão), sintetiza o sentimento com que muitas pessoas receberam a notícia da nomeação do marido de Ana Manso para auditor da ULS Guarda. A notícia foi divulgada nas edições online dos jornais, nomeadamente em ointerior.pt, e rapidamente chegou às redes sociais onde os comentários exigiram mesmo não apenas a demissão do auditor nomeado, mas inclusive da administradora que o nomeou. A decisão salomónica do Conselho de Administração presidido pela antiga deputada do PSD fez correr tinta e foi mesmo destaque na imprensa nacional. Ana Manso acabou por ser obrigada, pelo Ministro da Saúde, a anular a nomeação do marido. Mas o incidente marca o regresso de Ana Manso ao poder. E se não consegue que a nomeação do marido “passe”, consegue que outras sejam aceites, como a de João Bandurra, um seu fiel do PSD, que surpreendentemente chega a assessor do hospital, não se sabe em que regime – num tempo de crise, em que a administração pública devia gastar com parcimónia o dinheiro que tira dos bolsos dos contribuintes sacrificados, ainda há dinheiro para avençar ou contratar serviços de amigos? Em apenas dois meses, a ex-deputada conseguiu pôr fim a um tempo de paz no hospital da Guarda e acabou com o espirito de missão com que muitos médicos e técnicos trabalhavam na ULS Guarda. Em apenas dois meses, Ana Manso conseguiu que de novo tenhamos médicos a ameaçar partir e serviços a viverem polémicas do passado.

Correm tempos difíceis. Tempos de crise e austeridade. Tempos em que as práticas políticas são auscultadas e as ações dos decisores analisadas ao pormenor. Tempos em que o cidadão não confia nos políticos e os partidos são vistos como um bando de oportunistas. Tempos em que tudo é escrupulosamente visto e revisto. Tempos em que os Políticos devem decidir com cuidado redobrado.

2. Entretanto, a Câmara da Guarda, que não tem dinheiro para pagar a fornecedores, continua a sua senda de gastar, gastar e gastar. E gastar em propaganda para assim tentar dissimular a sua incompetência e inépcia. Assim, aprovou na última reunião do executivo o ajuste direto no valor de (até) 36 mil euros de «produção e disponibilização de conteúdos audiovisuais». O procedimento aprovado deverá significar a renovação (alargamento) do contrato de prestação de serviços com a Localvisão, a quem o município já pagava dois mil euros por mês para se ver numa webtv, uma das formas de propaganda eleita pela autarquia, aumentando os custos para três mil euros por mês. O regabofe afinal continua! Não há crise, não há dificuldade que pare este despesismo sem sentido da Câmara da Guarda. Sócrates fugiu, mas os seus amigos continuam a torpedear o esforço de todos. O suor dos portugueses continua a valer pouco para os socráticos!

Luis Baptista-Martins

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