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Galo voltou a ser morto na Guarda

Apesar do mau tempo, a Praça Velha encheu-se de pessoas para assistir ao “Julgamento e Morte do galo do Entrudo”

Cumpriu-se a tradição. O galo do Entrudo foi mais uma vez julgado e morto na noite de segunda-feira em plena Praça Velha, na Guarda.

O cortejo começou pelas 21h30 na Alameda de Santo André, onde centenas de personagens místicas, cuspidores de fogo, malabaristas e alguns “bonecos” da sociedade desfilaram rumo à fogueira acesa para a figura principal da noite, o galo. O animal foi recriado numa estrutura de pano e papel com cerca de cinco metros de altura, elaborada pelo artista plástico guardense Daniel Martins. Ao som de muita música e de gritos de “morte ao galo”, o desfile do Entrudo guardense deambulou até à Praça Velha, onde um espectáculo musical, com figurantes em andas a dar vida a artefactos de pirotecnia, animaram os espectadores que foram lotando o recinto gradualmente. Pouco depois das 22h30, o culpado de todos os males que afectaram a cidade no último ano deu entrada neste verdadeiro tribunal popular e de pouco lhe valeu a presença de um advogado.

Como manda a tradição, o galináceo não teve escapatória e foi condenado, a bem dos nossos pecados e outros deslizes. Contudo, o clímax da acção foi interrompido por Américo Rodrigues, coordenador geral do espectáculo, para pedir desculpa por algumas falhas técnicas resultantes do tempo que se fez sentir nessa noite. «Decidimos manter o evento por respeito e consideração aos guardenses», sublinhou, dando início à “audiência”, que teve direito a juiz, polícia, advogados de defesa e acusação e povo. De nada valeu, pois o veredicto do galo estava escrito. Mas, antes de ser “assado” na fogueira, o animal teve ainda direito a um anjo da guarda, o último pedido que confirmava a surpresa da edição deste ano. Saindo de um foco de luz, um funâmbulo atravessou a praça caminhando sobre um arame e subiu depois uma estrutura em ferro situada junto ao sentenciado.

O galo aproveitou a surpresa e ainda clamou: «Ó meu queridinho anjo/ Dizem que da Guarda és/ Condói-te deste coitado/ Tira-me daqui a sete pés!…», mas o pedido não surtiu efeito está bem de ver. «Apronte-se já o churrasco/ Apiche-se fogo purificador/ Aproxime-se o carrasco/ E que morra o cantador!!!…», ordenou o juiz. O galináceo ardeu na fogueira, libertando o povo de todos os males que aconteceram em 2009 com um fogo de artificio. Para Joaquim Almeida, o espectáculo é «uma tradição já com algum historial e a que assisto desde há cinco anos a esta parte». O guardense considera o evento «muito engraçado», já que junta «esta multidão toda na Praça Velha para ver o julgamento e morte do galo». Por sua vez, Joaquim Pedroso vem todos os anos à Guarda: «Acho que é um evento que apela às tradições e à cultura popular da Guarda e foge ao que se costuma ver, muitas das vezes cópias do que se passa no Brasil», considerou, sublinhando a «mais-valia» que o espectáculo representa para a cidade, indo «à raiz da nossa cultura popular». Quanto ao mau tempo que se fez sentir durante a noite, defende que «o frio é saudável e faz parte da época».

O evento, orçado em 66 mil euros, foi uma produção da Culturguarda EM para a Câmara. Este ano os grupos contratados foram a Companhia Kull D’Sac (Valladolid), o Maracaibo Teatro (Alicante), a Trupilariante – Companhia de Teatro-Circo (Lisboa) e a Banda Filarmónica de Vila Nova de Tazem, que apresentou um reportório de marchas fúnebres, apropriado para a ocasião. Para a peculiar audiência foram convocados, Agostinho da Silva (o juiz), Rui Nuno (um polícia com a aparência semelhante a uma das gárgulas da Sé), Cristina Fernandes (a advogada de acusação Carolina Beatriz Ângelo), Carlos Lopes (o advogado de defesa Rui de Pina), Isabel Monteiro (a mulher do povo) e Albino Bárbara(o homem trauliteiro), que interpretaram os textos escritos por Norberto Gonçalves. O jornalista Joaquim Martins deu voz ao galo, e a narração ficou a cargo de Américo Rodrigues. No final, tal como no ano passado, o público foi convidado a saborear uma canja de galo ao som do fogo de artifício que encerrou o espectáculo.

Rafael Mangana Tradição carnavalesca cumpre-se desde 2001

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