Cerca de duas centenas de trabalhadores chegaram ao fim da linha na Delphi da Guarda. Sexta-feira foi o último dia das primeiras 315 pessoas que deixarão a empresa até ontem, no âmbito do processo de despedimento colectivo anunciado em Maio, e que vai abranger mais 185 funcionários até Março de 2010, devido à falta de encomendas.
No final do turno da tarde, as perguntas dos jornalistas esbarraram no silêncio e nos rostos fechados de quem saía apressado rumo a casa. Uma rotina que muitos deles não retomará nas próximas semanas por trabalhar na linha da Opel, a primeira a fechar, e ter cargos de chefia e direcção na fábrica da multinacional norte-americana de cablagens. O próprio director-geral passou a fazer parte da lista há 15 dias, sendo o cargo acumulado pelo responsável da unidade Castelo Branco – que já dirigriu a fábrica da Estação e parece não ter deixado muitas saudades. O ambiente parecia o de um dia normal, até porque muito poucos funcionários assumiram aos repórteres que estavam entre os despedidos. «Não se notou muito que este era o último dia de trabalho para muitos colegas. Claro que houve despedidas, mas as pessoas já estavam mentalizadas e não houve assim grandes cenas de choro e tristeza. É a vida», disse um deles, que ainda não sabe se a sua vez chegará no início do próximo ano.
Já Maria da Graça não soube explicar o que sentiu no último dia de trabalho na Delphi: «Não estou triste, porque já estava à espera de sair, mas também não vou contente, pois todos estamos preocupados com o futuro», declarou. Dizendo que houve «algumas lágrimas» na despedida, a funcionária, que conta 11 anos na empresa, esclarece, no entanto, que o ambiente não foi de tristeza. Quanto ao seu Natal, refere que será «como nos outros anos», até porque a ideia é não desanimar: «De momento não tenho nada em vista, mas estou à espera de dias melhores. Tenho colegas com situações bem piores que a minha, porque os maridos não têm trabalho», adianta. Caso diferente é o de Emília Teixeira, de 46 anos, natural de Vila Garcia, a poucos quilómetros da Guarda, que deixa a fábrica por vontade própria e por causa de tendinites. «Estou cheia delas, por isso pedi para sair e, hoje, é um alívio para mim», confessou, acrescentando ter «gostado muito» de trabalhar na Delphi nestes últimos 12 anos. «O meu futuro vai ser em casa. Com a minha idade já será difícil arranjar trabalho, mas o Centro de Emprego tem cursos e outras oportunidades. Se calhar, até pense em conseguir mais habilitações», refere.
Quem se foi despedir dos colegas foi o delegado do Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias Metalúrgicas e Metalomecânicas (STIMM). Para José Ambrósio, o momento é de «tristeza e preocupação», uma vez que na região não há empresas para absorver esta mão-de-obra, maioritariamente feminina e com cerca de 40 anos de idade. «A Delphi vai entregar os papéis para o fundo de desemprego no dia 4 de Janeiro, mas esta gente não tem grandes alternativas», garante, dizendo que os despedidos contam, em média, com 12 a 13 anos de serviço na Delphi e vão receber, a título de indemnização, dois meses de salário por ano de trabalho. O sindicalista adianta não haver ainda notícias de novos contratos de produção para o segundo trimestre de 2010, o que poderá significar mais despedimentos que os 185 previstos. Cenário que José Ambrósio recusa, acrescentando que depois de Março a fábrica empregará cerca de 430 pessoas e só produzirá para a Maserati e a Ferrari, além de outros produtos. «Sabemos que haverá 185 despedimentos, mas esperamos que o sector automóvel dê um pulo para que estes se reduzam ou não existam. Era bom que não houvesse», refere. O delegado do STIMM também aproveitou o dia para lamentar não ter sido ainda recebido pelo presidente da Câmara: «Pedi uma reunião há um mês, mas Joaquim Valente deve ter outras preocupações», lamentou.
Luis Martins