Após as ameaças de novembro passado, a Roche Farmacêutica decidiu na última segunda-feira suspender a venda de medicamentos a crédito a 23 hospitais do Serviço Nacional de Saúde, entre os quais o da Guarda, por acumularem dívidas há mais de 500 dias. A presidente do Conselho de Administração (CA) da Unidade Local de Saúde da Guarda recebeu a decisão com «alguma preocupação», reconhecendo a existência de um valor em falta de mais de 900 mil euros.
A Roche esclareceu que a venda de medicamentos às entidades hospitalares em causa continuará a fazer-se, mas apenas a pronto pagamento. O laboratório lembrou que os hospitais do SNS acumulam neste momento dívidas «superiores a 135 milhões de euros», além de juros de mora no valor de seis milhões de euros e um atraso médio no pagamento superior a 420 dias. A empresa sublinha que esta decisão «é plenamente justificada pelo reiterado e sucessivo incumprimento dos compromissos assumidos anteriormente pelos referidos hospitais», reforçando que «continua disponível para negociar um acordo justo e equilibrado para todas as partes interessadas». Em comunicado, a empresa disse acreditar que «serão criadas as condições necessárias para que doentes e profissionais de saúde nunca fiquem privados dos nossos medicamentos».
A presidente do CA da ULS da Guarda recebeu a decisão da empresa com «alguma preocupação», aguardando que a Roche «não aplique de régua e esquadro as medidas que anunciou». Ana Manso espera que a empresa «tenha em consideração que o doente é o centro do sistema de saúde e que estamos a cumprir um plano de regularização da dívida, que já por si nos exige um esforço acrescido», e que consiste «na liquidação e recuperação, todos os meses, de dois meses da dívida mais antiga», sendo que a dívida da ULS à farmacêutica ultrapassa os 900 mil euros. A responsável assegura que «temos fármacos em stock para assegurar o tratamento aos doentes que necessitam de medicação fornecida pela Roche e acreditamos que, rapidamente, seja encontrada uma solução que não coloque os tratamentos em risco». De acordo com dados da Apifarma – Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica, a ULS da Guarda tem um prazo médio de pagamento à Roche de 883 dias.
O Ministério da Saúde também já reagiu à decisão da empresa e garante que não haverá «qualquer interrupção de tratamentos atuais e futuros e que os hospitais do SNS continuarão a disponibilizar, sempre que justificado, os medicamentos fornecidos pela Roche». O Ministério assegurou que o SNS «encontrará soluções alternativas, inclusivamente junto de outros fornecedores», lamentando a decisão da farmacêutica, recordando que «durante anos, a Roche beneficiou de centenas de milhões de euros de proveitos do SNS, pelo que esta decisão é uma atitude reprovável de um parceiro, ainda mais numa altura em que o país se encontra em situação de grande endividamento e num esforço histórico para ultrapassar a crise financeira». Também o Instituto da Farmácia e do Medicamento (Infarmed) já reagiu, considerando que é ilegal a decisão da Roche de suspender o fornecimento de medicamentos. Aquela autoridade sustenta que cortar o fornecimento de fármacos apenas por razões financeiras, além de «eticamente reprovável», viola a lei e é passível de punição.
Ricardo Cordeiro