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Elites

Quebra-Cabeças

Dizem então todos que temos uma crise de elites. Não que as elites estejam em crise, mas tão só que aqueles que hoje colocamos no topo, fossem os tempos outros, estariam eles no seu humilde lugar. Bem poderíamos regozijar-nos com as desgraças alheias, sobretudo as respeitantes a ricos e poderosos, não fosse a infeliz circunstância de esta crise nos implicar a todos: temos elites de baixo nível porque a nossa sociedade, ou seja todos nós, não é capaz de produzir melhor. Quando a fina flor não presta, que dizer do comum repolho?

No recente debate sobre as comunidades urbanas, a regionalização na eufemística versão PSD, tivemos oportunidade de apreciar as capacidades das nossas elites. Sei bem que é mais fácil criticar do que estar lá. É muito mais simples apontar os erros do que a sua solução. Como advogado, sei que é mais simples contestar uma acção do que intentá-la. Mas também sei que, por isso mesmo, governa quem propõe e opõe-se quem perdeu. Isto, claro, contando com o discernimento e sabedoria de quem escolheu, coisa hoje cada vez mais duvidosa. Regressando às nossas elites, tenho a relatar o seguinte a propósito do que ouvi no Hotel de Turismo da Guarda no dia do debate:

Maria do Carmo Borges leu o seu depoimento. Justificou-se dizendo que o assunto era de tão magna importância que era aconselhável trazer uma intervenção escrita. Na altura, íamos a meio do debate, a coisa não caiu muito bem. Tínhamos ouvido até então intervenções de improviso mas bem estruturadas, encadeadas umas nas outras. Os intervenientes falavam em função daquilo que pensavam mas também respondiam ao que tinham acabado de ouvir. Maria do Carmo, ou quem escreveu o texto por ela, fez tábua rasa das intervenções que a antecederam. Leu um textinho fraco, pretensamente didáctico, em que fez um historial do processo perante quem esperava, mais do que história, de todos mais que conhecida e mais que irrelevante para o que interessava, soluções e propostas concretas.

Ana Manso fez quase o mesmo. Leu também uma intervenção que não deu nada de novo ao debate e parecia escrita a contar com a presença de gente que não estava lá – por exemplo toda a Beira Baixa a sul da Gardunha. Não respondeu a ninguém, não influenciou a opinião de ninguém, não deixou uma única ideia que mereça sequer figurar como epitáfio no túmulo do Distrito da Guarda. Melhor que ela, por exemplo, esteve Álvaro Amaro.

Pina Moura pertence a outro campeonato. Disse algumas coisas que merecem reflexão: a interioridade não é prejuízo por definição, que se estamos longe do mar estamos perto da raia e algum benefício irá decorrer daí. Foi honesto: em lugar de chafurdar em redor das contradições do PSD neste processo, preferiu aplaudir a ideia de regionalizar independentemente de quem o fez e sob que pretexto. Sabia do que falava, via-se que tinha pensado no assunto sem preconceitos nem calculismos. É verdade que o seu nome vai ficar associado por muito tempo à infeliz questão do défice orçamental, mas deixou a ideia de que, por ele, a nossa região não ficaria tão abandonada, tão órfã.

Por: António Ferreira

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