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É possível mudar

Editorial

1. Eduardo Lourenço recebeu na passada segunda-feira o Prémio Pessoa. O galardão foi entregue pelo Presidente da República, mas seriam as palavras do presidente do júri que atravessaram de forma mais vincada a sala da Cuturgest ao destacar que «precisamos mais do que nunca da sua inteligência e do seu envolvimento para sairmos do pesadelo e voltarmos ao sonho». Francisco Pinto Balsemão, que de certa forma foi quem há 25 anos institucionalizou aquele que é porventura o mais relevante prémio que se atribui em Portugal, tem razão: a inteligência e o pensamento de Eduardo Lourenço são sempre imprescindíveis, mas num tempo de descrença, de dúvida, incerteza e incredulidade torna-se essencial podermos contar com o otimismo e sobriedade do “nosso” pensador.

Eduardo Lourenço imortalizado na Guarda teve o Portugal cultural dobrado e encantado com a sua simplicidade e categoria. Um Portugal rendido perante a dimensão humana e intelectual de um dos mais notáveis portugueses do seu tempo. Um grande português. O intelectual ibérico. E, porventura, depois de Vergílio Ferreira, o mais notável filho da região.

2. A “aula” de Manuel Maria Carrilho, no café-concerto do TMG, há uma semana, foi um grande momento. Para Carrilho foi um regresso às origens, a que orgulhosamente se referiu – como o fruto «do amor entre duas pessoas de cidades rivais», Guarda e Viseu. Mas foi essencialmente um grande momento pela deliciosa comunicação que fez sobre a interpretação que faz do mundo em que vivemos, deste tempo de crise em que todos estamos fartos de austeridade e ansiamos crescimento – mas «que crescimento? quem nos explica que crescimento» é esse? Porque de facto todos falamos dele, mas não conhecemos a sua tangibilidade.

Se o livro “De olhos bem abertos” foi o móbil da sua presença na Guarda, Carrilho trouxe-nos «uma contribuição» para o debate de ideias, para a mudança de paradigma e de perspetiva. Falou de realismo e de utopia, da crise e do crescimento, do seu tempo no governo e do PS. E falou sem pruridos da forma como repudia os “action man”, «os Berlusconi ou os Sarkozy», e sobretudo José Sócrates – que liderou o seu partido, «porque os partidos são o pilar essencial da Democracia» e não aprecia nada «essa ideia de independentes que estão numa prateleira dourada, numa qualquer universidade, e são chamados a ocupar funções como se fossem melhores, só porque são apresentados como “independentes”». Mas, para além de Sócrates, e por culpa de Sócrates, Carrilho recordou o que se fez na cultura em Portugal e o que se foi destruindo nos últimos anos. E o quanto o país pode empobrecer por essa falta de aposta na cultura.

3. No PS Guarda há neste momento uma estranha disputa. Fonseca Ferreira um veterano socialista, regressado à região, embarcou na aventura de pugnar pela liderança distrital dos socialistas. Pela frente vai ter José Albano, que representa tudo aquilo que faz dos partidos “territórios” pouco recomendáveis e, muitas vezes, apenas apetecíveis para quem crê que a política é um fim em si mesmo.

Luis Baptista-Martins

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