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E para a banca não vai nada, nada, nada?

A entrevista de Assunção Cristas ao jornal “Público” fez-me recordar a pergunta retórica do grito académico, segundo o qual para uma determinada pessoa, grupo ou instituição “não vai nada, nada, nada?”. Se nesse grito quisermos fazer loas ao sistema financeiro nacional, e tivermos em consideração a legislatura do Governo de que a líder centrista fez parte, a resposta, porém, não pode ser “tudo” mas um rotundo “nada”.

«O Conselho de Ministros nunca foi envolvido nas questões da banca», assumiu a presidente do CDS. Esta sinceridade surpreendeu muitos e indignou alguns. Mas não devia. É que Cristas era ministra de um executivo que tinha Passos Coelho como líder, alguém que reiteradamente defendia que a banca era um assunto que só dizia respeito ao sector privado, pelo que deveria permanecer nessa esfera, não devendo ser trazido para o debate público. A proposta de privatização da Caixa Geral de Depósitos está inserida nesta premissa de mão invisível que Passos terá aprendido num qualquer workshop liberal.

Assunção Cristas assumiu ainda ter assinado de cruz a resolução do BES. Entretanto rejeitou tê-lo feito mas é difícil entender de outra forma a resposta a um email da então ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque: «Sim senhora, somos solidários, isso é para fazer, damos o OK». Como escreveu João Quadros no “Jornal de Negócios”, «este OK cego da Assunção é uma espécie de KO do discurso de exigência que a líder do CDS exibe na Assembleia». A líder centrista justificou tudo isto com a «confiança» no Banco de Portugal, o que sendo compreensível face ao posicionamento ideológico do seu Governo, é inaceitável se tida em conta a realidade do país.

Realidade fácil de resumir. Depois de BPN e BPP, houve BES, Banif e agora a CGD, sem esquecer o “sagrado” Montepio. Foi este quadro que levou a troika a definir, no programa de assistência financeira, uma rubrica de 12 mil milhões de euros para a estabilização dos bancos, dos quais metade ficou por utilizar. A explicação é simples, havia uma saída limpa para garantir e eleições no médio-prazo para ganhar. Estratégia que até resultou porque Portugal conseguiu a tal saída limpa e o PàF venceu as eleições.

Se o plano funcionou, a banca afundou. Pouco depois de chegar a São Bento, António Costa anunciou inesperadamente, num domingo à noite, a resolução do Banif. O que só surpreendeu os desatentos (Cristas incluída?), porque há muito se sabia que a instituição madeirense estava em rutura. Seguiu-se a também há muito protelada recapitalização da Caixa e prossegue o cortejo fúnebre da venda do Novo Banco.

O anterior Governo proclama ter enfrentado e superado todo o tipo de dificuldades. Só que esqueceu-se do sistema financeiro, o problema que, a par da dívida pública e da estagnação económica, mantém o garrote sobre a economia portuguesa. É por isso que sempre que os intervenientes do PàF vierem dizer que fizeram «tudo» pelo país, terão de ser recordados que não fizeram “nada” em relação à banca. Uma inação que estamos e estaremos todos a pagar.

Por: David Santiago

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