“O nosso amigo morreu”, “ficámos mais sós”. Assim escreveu a Teresa desde o Algarve e eu reenviei-a tal e qual a todos quantos suspeitei lhe tinham amizade. O Pedro foi meu diretor de Serviço no Hospital da Guarda e era um homem exemplar. Com ele aprendi, com ele partilhei e com ele sofri impropérios, maldades gratuitas e percebi a força da elevação e da determinação na resposta. «Não gosto dessa mania de regar o pé!» – dizia com frequência. Odiava a vaidade de alguns, o excesso de certezas de muitos e a incapacidade de conversas que o ego a mais provoca. O Dr. Pedro Albuquerque enfrentava, confrontava, exigia e cumpria. Sobre a sua secretária não sobravam papeis. As decisões tomavam-se na hora e as opções alcatroavam caminhos. De facto, na sua sabedoria havia alguns conceitos firmes:
– uma pereira não dá bananas e um burro dá coices! Oh! Diogo não insista nalguns consensos, a vida é muito clara sobre algumas questões e aqui conhecemos egos que aniquilam talentos.
O Dr. Pedro soube que tinha chegado o seu fim quando, há poucos meses, a caminho do Algarve, as capacidades intelectuais se obnubilaram. Foi ver o que se passava com a ajuda sofrida da Teresa. Fez-se o diagnóstico e na sua infinita coragem, lá foi ao encontro da família mais restrita e fechou-se ao mundo que não compreendia. O Mundo dos que insistem na morte pública, na morte em lugares partilhados com desconhecidos. Recusou tratamentos que percebeu serem desnecessários e despediu-se de mim há três semanas numas curtas lágrimas que me tolheram a voz, afogando a dor. A voz dele, firme. Sempre muito firme e determinado e sempre capaz de ouvir e de conversar. Claro que definia fronteiras onde encontrava pobreza de espírito, falha de princípios, pequenez intelectual.
O Dr. Pedro lia obsessivamente, pilotava aviões, caçava, criava e educava seus cães, tinha um ritmo asceta de vida, sem luxos, sem mordomias, sem devaneios. Não fazia patuscadas, não gostava de conversas umbilicais, nem diálogos surdos, nem percebia o alcoolismo ou outras dependências.
Convidou-me para ir até à Guarda por sugestão do Paulo Correia em 1998, ainda bem que fui. Era então a melhor nota Nacional a concurso de vagas e escolhi a Guarda. Convidou-me para o suceder no Algarve, Lagos, onde agora trabalhava, e essas são as medalhas das minhas memórias. Morreu uma pessoa grande, um cidadão exemplar, um homem que me engrandeceu, por ser meu amigo. Bem Hajas.
Por: Diogo Cabrita