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Das posições indignas à indignidade de não assumir posições

O presidente da Comissão Europeia (CE) Jean-Claude Juncker lamentou que nos processos de ajustamento impostos pela antidemocrática troika se tenha pecado contra a dignidade dos cidadãos de países como Portugal, Grécia e Irlanda. Pena não ter assumido esta posição antes das eleições para a CE.

A parte do Governo que é PSD, bem como a sua bancada parlamentar, criticaram a infelicidade da afirmação. Passos Coelho prontificou-se a assegurar que «a dignidade dos portugueses nunca esteve em causa». O mesmo Passos que disse concordar com tudo aquilo que era preconizado pela troika, asseverando pretender ir ainda mais além, explicou que também o seu Executivo manteve graves divergências com as instituições credoras. O primeiro-ministro persiste em fazer crer que a desfaçatez não é, em si mesma, um ataque à dignidade dos portugueses.

Já o CDS garante ter dito desde a primeira hora que a dignidade de Portugal foi posta em causa depois do país se ter tornado numa espécie de “protetorado”. Esquecendo que foi uma irredutível sede de poder que levou a direita portuguesa a recusar o PEC 4 e a tornar a intervenção externa irrevogável. Negligenciou ainda que a revogabilidade de certos atos levou ao agravamento das dificuldades de recuperação do país. Garantindo somente condições de vida menos dignas para muitos portugueses.

Juncker, que outrora juntou PS, PSD e CDS no apoio ao nome do luxemburguês para a liderança da CE, é agora foco de profundas divergências. António Costa classifica Juncker de «sábio» e vê nas palavras deste a prova de que estamos perante a mudança na Europa. Contudo, o mesmo Costa que se afastou das medidas iniciais anunciadas pelo novo Governo grego, afirmando-se um português que apenas quer uma mudança europeia, seja ela qual for, aproxima-se da Grécia logo que as coisas correm melhor e um acordo é alcançado.

Costa criticou ferozmente a oposição da ministra Maria Luís Albuquerque ao acordo alcançado no Eurogrupo da sexta-feira passada. O líder socialista não concebe que, tal como ele próprio, haja quem mantenha as suas posições. António Costa continua fiel à máxima de nenhuma posição assumir, assim permanecendo um político coerente. E critica a ministra por também ela permanecer no rumo até aqui trilhado.

Ora, é por demais evidente que o Governo levará até ao fim a postura de bom aluno. É natural que Maria Luís tente limitar a flexibilização do novo acordo com a Grécia, insistindo na defesa do virtuosismo da austeridade como regeneradora da economia. É uma aposta eleitoralmente adequada, mesmo que contrária aos interesses nacionais. Quanto menos concessões forem dadas a Atenas, melhor, em termos eleitorais, para PSD e CDS. Mas é de lamentar nova oportunidade perdida para, dignamente, se assumirem os atos praticados.

Mas António Costa também peca. Por dupla omissão: sobre o que pensa das propostas do Executivo grego e sobre o que defende para Portugal. E ir assim a eleições também será atentar contra a dignidade dos portugueses.

Por: David Santiago

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