O sonho ainda não terminou. Virgílio Bento queria “devolver” os movimentos aos pacientes que sofreram um AVC (Acidente Vascular Cerebral) e, hoje, está mais perto de o conseguir. No âmbito do doutoramento que está a realizar na Universidade de Aveiro, o jovem foi premiado numa das mais importantes conferências de Biomédica de Boston (Estados Unidos) por ter desenvolvido um sistema que permite a monitorização dos movimentos e exercícios de recuperação dos doentes depois de regressarem a casa.
O investigador admite que o caminho a percorrer ainda é longo, mas o galardão poderá ajudar «a atrair investimento para a criação de protótipos». A ideia surgiu com a colaboração do professor Vítor Cruz, neurologista no Hospital de São João, e foi concretizada por Virgílio Bento e mais dois colegas, Márcio Colunas e David Ribeiro. Depois de um AVC, são muitos os doentes que perdem movimentos e a janela de recuperação abre-se sobretudo entre os primeiros três a seis meses. «Os clínicos mandam os pacientes para casa e recomendam-lhes uma série de tarefas motoras. O problema é que não têm maneira de saber se eles fazem mesmo os exercícios e se os fazem bem», refere. O desafio estava lançado: era preciso encontrar, através de novas tecnologias, um sistema que permitisse “vigiar” o paciente, mostrando-lhe quais os movimentos corretos e como devem ser feitos. Cruzando diferentes áreas, nasceu o “The SWORD ambulatory rehabilitation system”.
Um dos módulos do dispositivo coloca-se no antebraço e o outro no braço. No computador, o programa vai-lhe dizendo que tipo de movimento deve fazer, se o está a fazer bem e como o poderá aperfeiçoar. Mais tarde, o clínico tem acesso ao histórico das tarefas e poderá acompanhar mais facilmente o processo. «Tentámos aplicar à medicina um sistema de quantificação de movimentos que já é usado na indústria dos videojogos», explica o jovem. O utilizador tem de ir passando os vários níveis de dificuldade, o que faz com que o sistema tenha também essa vertente de jogo, acabando por haver «maior adesão à terapia», considera ainda. Virgílio Bento revela que já foi contactado por algumas empresas que se mostraram interessadas no produto, mas o SWORD precisa ser otimizado. «Ainda temos um longo percurso para que se torne numa aplicação real, queremos testá-lo em casa dos pacientes para que seja infalível quando chegue ao mercado», refere.
O mundo à espreita
O percurso do investigador começou a delinear-se na Guarda, cidade onde cresceu e onde estudou até ao 12º ano. Já na reta final, foi a área das engenharias que mais o cativou. Na Universidade de Aveiro, licenciou-se em Engenharia Eletrónica e Telecomunicações, seguiu-se um mestrado e agora um doutoramento na mesma instituição. Regressar à cidade mais alta não está fora de questão e «não é impossível», admite. No entanto, «torna-se difícil começar aqui porque não existem muitas empresas que financiem este tipo de sistemas», lamenta. Por enquanto, quer terminar a tese de doutoramento que iniciou recentemente e, ao mesmo tempo, melhorar o “SWORD”. E depois resta o mundo. Porque Virgílio Bento acredita que «o objetivo não é pensar em Portugal, mas sim no mundo como um mercado». Depois do reconhecimento de clínicos e empreendedores em Boston, o investigador espera que o dispositivo possa ser comercializado a nível mundial e, para isso, pretende – num futuro próximo – constituir a sua própria empresa.
Catarina Pinto