Autarquia é única sócia desta associação que parece funcionar em roda livre, pois não são conhecidos relatórios de contas nem tem qualquer verba cabimentada nos Planos e Orçamentos de 2010 e 2011, além de não constar do rol de empresas e entidades participadas pelo município
A Câmara da Guarda tem uma imobiliária que se dedica exclusivamente a cobrar rendas no edifício do Solar dos Póvoas, em plena Praça Velha. Essa é atualmente a quase única função da Associação do Cybercentro da Guarda, criada em 2001 para promover e difundir as novas tecnologias da informação no município, mas que nem um web site tem.
A autarquia herdou esta associação sem fins lucrativos após a Fundação para Difusão das Novas Tecnologias da Informação (FDTI), o Instituo Português da Juventude (IPJ) e a ANACOM [a última a sair, em maio passado] terem desistido do projeto. Mas, em vez de a extinguir, por a sua missão ser agora irrelevante no contexto da difusão massiva da Internet, decidiu mantê-la. Mais, em junho passado, o executivo deliberou atribuir-lhe cerca de 30 mil euros para concretizar o seu plano de atividades – que não foi divulgado. Outras coletividades dos concelho não têm tido tanta sorte. O mistério da existência desta entidade adensa-se quando a dita associação, de que a Câmara é o único sócio, não consta sequer do rol de empresas e entidades em que o município tem participação – a última relação foi divulgada na Assembleia Municipal de setembro. Nem é conhecido qualquer relatório de contas da mesma, pelo menos que o executivo tenha analisado nos últimos dois mandatos. Também não se encontra qualquer verba cabimentada nos Planos e Orçamentos de 2010 e 2011 para o seu funcionamento e atividades. A ideia que perpassa é que a entidade funciona em roda livre, não prestando sequer contas ao seu único associado, que também parece não fazer questão de a incorporar oficialmente no seu universo.
O que se sabe – e a autarquia confirma-o – é que o Cybercentro tem três funcionários e que nenhum tem vínculo à Câmara da Guarda. Apesar disso, a sua diretora, Gabriela Flor, é responsável pelo património municipal do Solar dos Póvoas, competindo-lhe cobrar as rendas aos seus três inquilinos (ADSI, Localvisão e Ourinvest), que, de acordo com informação do município, rendem «um total de 1.735 euros» mensais à associação. Joaquim Valente justifica a situação dizendo que o edifício foi cedido «protocolarmente» à Associação Cybercentro para esta poder desenvolver a sua ação. «Foi, depois, autorizada a ceder o espaço mediante o pagamento de uma verba que permitisse fazer frente as despesas realizadas, evitando honorar a associação pela gestão do espaço. Esta decisão foi objeto de análise e aprovação pelo executivo na altura (2002)», refere o presidente, num conjunto de respostas por escrito. De resto, é também responsabilidade do Cybercentro pagar os salários dos seus funcionários, recorrendo a esta e outras receitas provenientes da utilização dos computadores ali existentes – não é conhecida a taxa atual de frequência deste serviço nem o seu contributo para os cofres da associação.
Diretora acumula na Localvisão
O autarca também não vê inconveniente que a responsável acumule esta função com a direção da Localvisão, um dos inquilinos do emblemático solar e ao qual o município atribui mensalmente dois mil euros, no âmbito de uma adjudicação de serviços em que a empresa se compromete a fazer a cobertura de acontecimentos organizados pela autarquia. Na sua opinião, tal «só pode ser perspetivado como mais-valia, seja para o funcionário, seja para a entidade», até porque a Localvisão foi «unanimemente aceite por todos como uma mais-valia ao cumprimento da missão associativa. A diretora do Cybercentro foi, neste sentido, indicada para coordenar o projeto no âmbito das suas funções, sem pagamentos acrescidos», adianta Joaquim Valente. O edil garante ainda que o Cybercentro vai manter-se «enquanto continuar a ser identificada a necessidade da sua existência». Nesse sentido, «temos vindo a identificar novos focos de intervenção prioritários, como sejam os seniores, as associações, o comércio tradicional e, atualmente, estamos a elaborar um estudo que nos permita aferir a melhor forma de atuação no cumprimento desta missão que continua a ser fundamental para uma sociedade equitativa».
Entretanto, o município não perspetiva fazer novos suprimentos financeiros «nos próximos tempos» para resolver os problemas de tesouraria da associação, esclarecendo que a sua missão é «viabilizar a associação num contexto de apoio ao seu funcionamento que pode passar, entre outros, por transferência de verbas. Não é expectável que nos próximos tempos exista essa necessidade». Aliás, acrescenta Joaquim Valente, existe um grupo de trabalho na Câmara que, em conjunto com o Cybercentro, está «a analisar outras formas de dinamização da associação, nomeadamente em proximidade com uma intervenção em termos de promoção económica e social, principalmente no contexto do centro histórico da Guarda».
Luis Martins
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