1. O ingresso no ensino superior este ano tem alguns matizes sobre os quais faz sentido refletir. Desde logo, perceber o impacto da redução de 5% das vagas nas instituições de ensino superior (IES) de Lisboa e Porto (menos Medicina), cujo sucesso foi relevante e contribuiu para estancar a provável redução de estudantes nas IES do interior. A medida deve ser melhorada e porventura em alguns cursos até deveria excluir as universidades de Aveiro, Braga ou Coimbra que, por razões económicas, sociais e geográficas (e históricas), têm uma capacidade de atração que supera as do interior – e, afinal, se a medida visa potencializar as academias dos territórios de baixa densidade, as universidades do Minho, Aveiro ou Coimbra têm um contexto diverso, de alta densidade e com uma atratividade natural e óbvia. Por outro lado, é preciso combater uma certa “elitização” assumida por algumas instituições do litoral – basta ouvir o presidente do Técnico, Arlindo Oliveira – e que permite uma hegemonia que pressupõe uma superior qualificação, que nem sempre corresponde à realidade. E olhar para a estratégia de internacionalização e de crescimento de instituições, como o Politécnico de Bragança, que por antecipação definiu como caminho a angariação de alunos em África. Ou a aposta da internacionalização da UBI, nomeadamente com o grande crescimento de alunos oriundos do Brasil. E, por último, o facto de alguns politécnicos, nomeadamente o da Guarda, continuarem na última linha das escolhas dos candidatos ao ensino superior, com o ingresso de alunos inclusive com médias negativas (e nem assim conseguindo ocupar todas as vagas anunciadas). Tudo isto enquanto percebemos que o modelo de financiamento do ensino superior penaliza gravemente as instituições do interior. Enquanto sabemos que estudar em Lisboa e Porto é extraordinariamente caro para a maioria dos alunos originários do resto do país – um país que apostou no turismo, que cresceu turisticamente e que agora descobre que os quartos que podiam servir de guarida aos estudantes são rentabilizados com arrendamento rápido aos turistas: uma frustração para os que não podem pagar a conta, como o jovem luso-venezuelano Juan Baptista, que abandonou o Técnico para estudar na Universidade da Madeira num curso de engenharia que se notabilizou pela média do único aluno que aí ingressou, com 18,94).
2. Portugal está em 10º lugar no ranking das democracias a nível mundial, segundo o Relatório da Democracia de 2018, que avalia a qualidade da democracia em 201 países de todo o mundo. No índice das democracias liberais, que valoriza não só uma democracia formal, mas onde são respeitados os direitos e liberdades da população, Portugal fica atrás apenas da Noruega, Suécia, Estónia, Suíça, Dinamarca, Costa Rica, Finlândia, Austrália e Nova Zelândia, que lideram o ranking por esta ordem.
Como é óbvio, este estudo é um retrato macro da democracia portuguesa e analisa a democracia e o poder central, mas não considera o “país real”, o dos pequenos poderes, o das autarquias locais e dos poderes descentrados onde a liberdade de expressão é oprimida e os direitos, liberdades e garantias não são respeitados. A Democracia portuguesa está consolidada, mas o país do “respeitinho” não aparece nos estudos. A Imprensa Regional vive cada vez mais pressionada por esses “pequenos-poderes”, pela pressão económica, pelo controlo da publicidade institucional, pela fragilidade legal e pelo atropelo das regras básicas da liberdade de expressão. No “Portugal profundo” a divergência de opinião e o desrespeito pelos adversários políticos continua nos antípodas da democraticidade.
Luis Baptista-Martins