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Com o dinheiro alheio

Um cidadão pode fazer jardins, pontes, usar bons carros, atrever-se a boas vivendas e gastar uma fortuna em roupas e tudo isso é matéria do seu desejo, ou fruto da visão que tem de bem estar. A frugalidade é tempero do desejo, é moderação da gula. E podemos moderar o desejo que cresce no poder? E podemos conter os sonhos de obra, de marcar de ícones a existência? Isso é tudo mais difícil se o poder nos entrega um recurso infinito, ou apenas possibilidades desmedidas daquela que antes imaginávamos. Um cartão de crédito, um número incrível de benesses, um luxo constante. Vejamos o sindicalista que só se aloja em hotéis de cinco estrelas, ou o vereador que decide comer seguindo o roteiro Michelin. O dinheiro alheio é colocado ao dispor de um Bastonário de uma Ordem, de um diretor de um hospital, de um líder sindical, de um presidente de uma fundação, de um gestor da EDP e neste caldo se coze a sopa do deslumbramento, a pirâmide dos desejos e das imodéstias. As pessoas são definidas pelos seus pecados mortais, sempre os mesmos e dificilmente construímos outros (tentem o exercício de revelar o oitavo ou o nono) envolvendo o cenário do poder e da força de decisão. Ter poder com frugalidade é quase uma antinomia. Exercer poder com decisão e sem deslumbramento é quase uma impossibilidade. A força do dinheiro alheio em nós é ofuscante. Imaginem que a EDP retira as taxas da conta e pagamos só a luz que consumimos. Imaginem que a Carris e a CP encerram tudo o que tem prejuízo superior a duas vezes o custo. Imaginem um presidente de Câmara que em todo o mandato só mantém, não constrói. Há tantos exercícios surpreendentes que podemos tentar.

Por: Diogo Cabrita

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