Conheci um tipo que não tinha habilidades especiais. Depois percebi que os conhecimentos eram poucos. Não foi fácil porque ele não emitia opiniões. Normalmente baseava o discurso numas premissas esquivas. Transferia os problemas, adiava-os e sobretudo afastava-se deles. Ele sabia de tudo sem conhecer nada. Foi Director de Hospital, geriu empresas, aceitou cargos em bibliotecas, fez assessorias, foi formador de técnicos, deu aulas e foi Presidente do Clube de Futebol. Em nada se lhe conheceu uma obra, em nada se lhe reconhece um selo. Foi uma figura omnipresente sem que ficasse trabalho. Esta figura Coimbrã é um sábio da vida. Sempre que uma onda se erguia ele baixava-se e quando aquela tinha passado, lá estava ele de novo. Estas figuras jacobinas que se apadrinhavam umas às outras e se protegiam e guindavam ao estrelato, conduziram Coimbra a um beco sem saída. Directores medíocres escolhiam equipas medíocres e no fim todos recebiam bem, todos faziam pouco e ninguém beneficiava das opções. Assim se fechou o clube, assim se hipotecou a instituição e depois se distribuíram as medalhas de mérito. Não ficou um texto, ninguém recorda uma oração, um momento eloquente. Sobram memórias de conversas nos corredores, de passeios por entre as árvores, de longas conversas de café, de intermináveis almoços regados do melhor, pagos por alguém. Esta figura detestava pagar. Dos seus conselhos válidos ficam os de “vai com calma, não digas nada, melhor ficares calado, isso é uma enormidade sem importância”. Nos momentos mais difíceis sugeria a retirada, um pedido de férias, uma licença sem vencimento, por vezes um atestado médico. Este génio de Coimbra só deixou a ribalta quando as pernas o não deixavam andar, quando a voz se perdia e depois de percorrer a presidência de inúmeras agremiações, instituições e outros lugares em que nada fez senão ser a escolha consensual. Para que todos se dessem bem, abdicavam todos de qualquer reivindicação, e lá sobrava ele que não tinha ideias, que não tinha destino.
Por: Diogo Cabrita