A Câmara da Guarda tem mais um problema para resolver. O Tribunal de Contas (TC) chumbou a contração de um empréstimo de 1,7 milhões de euros para a autarquia liquidar a sua quota parte da dívida da sociedade PolisGuarda, extinta em setembro de 2010. O argumento dos auditores é que, nesse ano, o município estava impedido de o fazer por ter excedido os limites de endividamento.
Segundo o acórdão de 30 de janeiro deste ano – que ainda não transitou em julgado, a que O INTERIOR teve acesso, quando se propôs contrair esse empréstimo bancário, pelo prazo de 25 anos, – o montante foi reduzido para cerca de 1,6 milhões por força de um aditamento contratualizado em fevereiro de 2011 com a Caixa de Crédito Agrícola da Serra da Estrela, que venceu a consulta – a Câmara da Guarda tinha ultrapassado em mais de 7,7 milhões de euros o limite de endividamento de médio e longo prazo. Já no endividamento líquido, o excesso era da ordem dos 1,8 milhões de euros. O TC acrescenta que, «embora requerido, o Ministro das Finanças, e, ainda, o secretário de Estado do Orçamento não emitiram qualquer despacho autorizativo do excepcionamento do empréstimo em causa», tendo então alertado a autarquia para situação de ilegalidade em que corria, mas esta manteve a submissão do respetivo contrato à fiscalização prévia do Tribunal de Contas. Nestas circunstâncias, o TC conclui que o município «não poderia, obviamente, contrair o presente empréstimo [ainda que sob o montante acordado em 22.02.2011], por manifesta ultrapassagem dos limites legais de endividamento».
Como se isso não bastasse, o Tribunal constata também que a autarquia tencionava gastar o dinheiro na regularização de encargos resultantes do processo de dissolução e liquidação da PolisGuarda, sociedade anónima constituída por capitais exclusivamente públicos e detida a 60 por cento pelo Estado Português e a 40 por cento pelo município. Ora, a Lei das Finanças Locais estipula que os empréstimos a médio e longo prazos podem ser contraídos para aplicação em investimentos, «os quais devem estar devidamente identificados no respetivo contrato, ou, ainda, para proceder ao saneamento ou ao reequilíbrio financeiro dos municípios. No caso da Guarda, o TC considera que o objetivo da Câmara era pagar «faturas, expropriações e livranças», o que «não se subsumem, obviamente, e por si, ao conceito de “despesas de investimento”». Ao que O INTERIOR apurou, o banco aguardava pelo visto do Tribunal de Contas para atribuir o montante solicitado, pelo que esta recusa deixa sem efeito o empréstimo em causa.
Outra curiosidade deste processo é que decorreu pouco mais de um ano entre a sua entrada naquele órgão fiscalizador e o acórdão produzido em janeiro passado. A situação deve-se ao facto do contrato ter sido devolvido à autarquia em 2010 para esclarecer algumas questões, o que suspende automaticamente o prazo de 30 dias previsto na lei para o TC se pronunciar e evitar o visto tácito. Contudo, neste caso, a Câmara terá demorado nove meses a responder, pois o processo deu novamente entrada no TC no final de 2011, soube O INTERIOR. A mesma demora está a verificar-se na divulgação deste chumbo ao executivo, pois o assunto ainda não foi levado à sessão de Câmara mês e meio depois da autarquia ter tido conhecimento oficial da recusa do visto. Recorde-se que a sociedade Polis apresentou um passivo de cerca de 2,6 milhões de euros quando foi dissolvida. O INTERIOR tentou, sem efeito, contactar o presidente da Câmara, Joaquim Valente, sobre este assunto até ao fecho desta edição.
Luis Martins