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Bomba

Agora Digo Eu

Ao lembrar Chernobyl vêm-me à memória uma série de desastres: Three Mile Island, Fukushima, Erwin, Tricastin e isto sem esquecer a cidade secreta do regime bolchevique, que ainda hoje continua fechada devido aos sucessivos acidentes – Seversk, na Sibéria.

Vem isto a propósito do processo inadmissível da maldita central nuclear de Almaraz, junto à nossa fronteira, a mais antiga de Espanha, construída em 1972 tendo o primeiro reator entrado em funcionamento em 1981, com encerramento, desmantelamento e selagem em 2010. O governo de José Maria Aznar prolongou-lhe a vida até 2020 a pedido dos interesseiros acionistas.

Em Almaraz estão a ser utilizadas peças em alumínio e manganésio com visível falta de qualidade reconhecidas pela Comissão Técnica de Segurança Nuclear “os componentes são aceitáveis”.

O reator para trabalhar necessita de urânio enriquecido. O seu potencial é tão grande que uma simples grama produz uma quantidade de energia correspondente à explosão de 1.000 quilos de trinitrotolueno, mais conhecido por TNT.

O mineral enriquecido é volátil e corrosivo. Por ser volátil entra facilmente no organismo por inalação. Por ser corrosivo vai causando desgaste. A inalação vai destruir todos os tecidos. As células reproduzem-se rapidamente e dividem-se. Quando são apanhadas pela radiação morrem instantaneamente, podendo haver uma maior incidência de cancro e o aparecimento de malformações congénitas em homens e animais. O limite admissível de radiação é de 500 roentgens por ano. Os habitantes de Kiev, após o desastre de Chernobil, absorveram uma dose na ordem dos 150 milroentgens. A radiolesão passa a ser uma das doenças mais recentes e perigosas da humanidade.

A central nuclear de Almaraz teve até 2016 mais de 2.500 avarias. Este ano já parou duas vezes por problemas técnicos que ainda não foram devidamente esclarecidos. Perante isto o que fazer? O fator sorte tem existido e o governo português pode e deve (antes que seja demasiado tarde) acionar a Convenção de Espoo de 1991 que estabelece avaliações obrigando os Estados a pronunciarem-se pelos projetos suscetíveis de terem impacto ambiental transfronteiriço. As partes devem, quanto antes, estabelecerem um calendário para o encerramento definitivo desta central. Um reator tem vida máxima de 30 anos. Após isto é considerado obsoleto e extremamente perigoso.

E depois é a utilização em Arrocampo da água do Tejo que serve para arrefecer o reator, e a análise que temos aqui de fazer dos célebres resíduos… De acordo com a Agência Internacional de Energia Atómica os resíduos estão ainda hoje a serem arrumados na chamada Fossa do Atlântico, colocados em bidões de aço e betão lançados em 30 locais no Oceano Atlântico (650 km da Galiza e a uns 800 do norte de Portugal). Dizem os adeptos que não há perigo pois o material dos bidões resiste à corrosão durante milhares de anos e à profundidade de 5 km ou mais as águas são perfeitamente calmas. Os resíduos de um reator por ano são na ordem dos 50 m3. Isto a multiplicar pelos 400 reatores em funcionamento em todo o globo… e, isto sem esquecer que o mineral, mesmo depois de servir fica ativo pelo menos mais 2.000 anos!!!

É ou não verdade que, com a passividade completa das autoridades portuguesas, a mina de urânio a céu aberto funcionou entre 1974 e 2001 na pequena localidade de Saelices el Chico, a escassos quilómetros do nosso distrito? E que houve acidentes e descargas que puseram em causa o rio Águeda e consequentemente o riquíssimo e quase único ecossistema do Douro Internacional? E já agora é pertinente perguntar se as minas de urânio na Guarda, Sabugal, Gouveia, Pinhel, Trancoso, Fornos, Seia, Almeida, Aguiar estão definitivamente fechadas, seladas e vigiadas. E se a água que bebemos bem como o espaço que habitamos é seguro. Se há estudos nesse sentido e se o cancro do intestino e do estômago que na nossa zona atinge números significativos tem alguma coisas a ver com isto?

Almaraz é a bomba atómica, o cutelo que temos apontado ao nosso pescoço em distritos como Évora, Portalegre, Castelo Branco e Guarda. Aquilo está velho, podre, acabado, degradado. É tempo de alguém dizer que o rei vai nu. Não se lembrem somente de Santa Bárbara quando ouvirem os trovões. É que, dia menos dia, pode ser tarde. Muito tarde…

Por: Albino Bárbara

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