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Barragem da Senhora de Assedasse na gaveta

Aproveitamento hidroeléctrico do Alto Mondego, que também inclui os projectos de Girabolhos e Midões, não avança

Continua sem sair do papel o aproveitamento hidroeléctrico do Alto Mondego, que prevê a construção de barragens na zona da Senhora de Assedasse (Gouveia), Girabolhos (Seia) e em Midões (Tábua), já no distrito de Coimbra. O assunto voltou a ser falado no último sábado, em Seia, numa conferência sobre “As grandes barragens na bacia do Mondego”, que contou com a participação de vários especialistas e foi co-organizada pelos Rotary Clubes de Seia, Viseu, Mangualde, Covilhã, Oliveira do Hospital, Tondela e Trancoso.

A futura Barragem da Senhora de Assedasse é mesmo um «aproveitamento fabuloso», afirmou Alfeu Sá Marques, presidente da Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos. O também professor da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC) considera que o sistema projectado para o Alto Mondego não avança porque tem «uma albufeira numa zona protegida, como é a Serra da Estrela». Contudo, esse “obstáculo” poderia ser ultrapassado caso o assunto fosse «bem estudado» e os impactos «bem minimizados», sustentou. «É preferível ter alguma coisa que utilizasse continuamente a serra do que ter uma excursão de vez em quando», acrescentou. Em 2003, um estudo encomendado pela antiga Comissão de Coordenação da Região Centro (CCRC) a uma equipa de investigadores da Universidade de Coimbra concluiu que o projecto da Senhora de Assedasse era o empreendimento hidroeléctrico «mais vantajoso» de um conjunto de 14 aproveitamentos de média e grande dimensão que a EDP admitia vir a construir na região Centro. Contudo, desde essa altura que não se conhecem desenvolvimentos.

O mesmo especialista classificou ainda de «erro de planeamento» o abandono da construção da barragem de Foz Côa, no local onde foram descobertas as gravuras rupestres, classificadas posteriormente pela UNESCO como Património Mundial. Para Alfeu Sá Marques, essa barragem era «absolutamente essencial», pois permitiria «transferir volumes em excesso» que há no Douro para o Zêzere, através do Côa. O presidente da APRH considerou mesmo que Foz Côa está «condenada»: «A erosão é inexorável. As gravuras aguentaram 30 mil anos, dizem alguns, mas eu não acredito. Elas terão uns milhares de anos a menos, mas daqui a uns milhares de anos são rochas limpas e depois vamos ter que fazer alguma coisa», avisou, dizendo que «já estamos a pagar» os efeitos desta opção. Aliás, o professor não consegue entender «como é que um país que tem cinco vezes mais água que a média mundial, fale em escassez». É que, na sua opinião, «não há problema de falta de água» em Portugal, mas sim «de gestão».

Em Espanha passa-se precisamente o contrário, já que o país vizinho tem a maior quantidade de água armazenada per capita do mundo. «Estudaram bem a lição», sublinhou, por sua vez, Aníbal Traça de Almeida, professor catedrático da FCTUC. Este especialista salientou que a região Centro aproveita «apenas um quarto da água disponível» para a produção de energia, um número que poderia ser duplicado, sustentou. Também em relação à Senhora de Assedasse, afirmou que a criação de um «grande lago» nessa zona «só seria benéfica para o turismo na Serra da Estrela».

Outro dos intervenientes nesta conferência foi José Penedos. O presidente da Rede Energética Nacional (REN) sublinhou que «a aposta nas renováveis não deve dispensar a hidroeléctrica e a eólica, mas não pode esquecer a solar». Nesse sentido, adiantou que este tipo de energia pode ajudar a reduzir o impacto provocado pelo aquecimento das águas domésticas, que representam uma parte «significativa da energia eléctrica» consumida. O antigo secretário de Estado da Energia defendeu ainda que «as energias renováveis podem assegurar metade das necessidades energéticas» do país.

Ricardo Cordeiro

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