O meu amigo das cores vivas, dos traços precisos arrancados das telas negras, decidiu casar-se novamente. Fui a Cellanova, onde ele nasceu e conheceu Ana, a Cellanova onde a sua infância se foi consumindo e a sua inocência perdendo. Baldomero ama aquela Galiza profunda e aquela paisagem de vales e montes verdes, de rio ao fundo, de terras hoje amaldiçoadas do trabalho que dão e da falta de apoio comunitário que geram, as terras de onde saem os tractores que se manifestam em Lugo e Ourense contra a Europa dos preços estagnados. Baldomero encontrou um amor de infância, a mulher que guardou suas cartas de menino, que o quis sempre, que o “abensonhou”, como diria Mia Couto, que guardou suas telas simples, quando pintar era um deleite e um sintoma. Ana aguardou os cem anos que a vida dura não preencheu, esperou a “passagem dos tempos de cólera”, e um dia entregou-se-lhe perdidamente. Baldomero e Ana casaram-se rápido para não perder mais tempo de separação. Estavam felizes em cada instante e era essa felicidade que tinha de testemunhar e me fez feliz. Baldomero re-encontrou seu talento, redescobriu sua inspiração e as suas telas enchem-se de beijos:
-“diogo, son bicos, me salem siempre bicos”.
E bicos são beijos que preenchem as cores das suas telas grandes e pequenas. Assim sobe o rio da felicidade este homem que ontem encontrei feliz. Estas histórias de um primeiro amor serenar o espaço daqueles amores que entretanto falharam repete-se com alguma frequência e surgem-me num testemunho que hoje me coube expor. Deus os bendiga e lhes dê a tranquilidade e calor que tanto merecem.
Por: Diogo Cabrita