Desde há uns tempos que, em conversas de café, um amigo meu, meio a sério meio a brincar, diz, com o ar mais compenetrado deste mundo, que um destes dias irá incentivar a realização de um abaixo-assinado para propor a denúncia do Tratado de Alcanizes que, segundo ele, na atual conjuntura, apenas lhe vai trazendo mais e mais prejuízos, se não de identidade, pelo menos à carteira…
Na passada semana tivemos direito a mais uma daquelas notícias que bem dispensaríamos: soube-se, através dos órgãos de comunicação social, que os combustíveis tinham sofrido mais um aumento. Nada de novo se atentarmos na frequência com que estas notícias nos chegam. Estranha-se, isso sim, que aqui mesmo ao lado, para lá da raia, os preços sejam bem mais apelativos com diferenças que ultrapassam as três dezenas de cêntimos em litro. Isto quando se sabe que os salários de “nuestros hermanos” são bem maiores que os nossos. Uma das consequências imediatas e visíveis a olho nu é a falta de clientes das gasolineiras do lado de cá da fronteira por contraste com as filas que se formam para atestar o depósito em Espanha. Sim, que isto de patriotismo económico, de consumir preferencialmente produtos portugueses, tem o seu preço e, quando os euros são de dia em dia um bem mais raro, não há patriota que resista a uma poupança extra, ainda que tal ajude à desertificação populacional e económica do interior. Em boa verdade talvez devêssemos desmentir um antigo ministro que situava o deserto a sul do Tejo quando, por este andar, ele estará por aqui, bem mais perto…
A coisa ganha contornos de impercetibilidade quando o senhor primeiro-ministro, de ar teatralmente compungido, vem declarar que o Governo nada tem a ver com estas questões de aumentos nos combustíveis, que são fatores exógenos que explicam e justificam estes aumentos. De entre estes explicitou mesmo a relação cambial do euro com o dólar americano que, segundo o nosso primeiro, nos é, neste momento, desfavorável. Mas, cabe perguntar, não serão o mesmo euro e o mesmo dólar a determinar os preços em Espanha? É que se são, então não se entende… Ou, pura e simplesmente, serão os impostos, nomeadamente o imposto sobre produtos petrolíferos, a engordar a fatura que os portugueses têm que pagar em mais de cinquenta por cento? E se é assim, então o senhor primeiro-ministro, ou não sabia ou não quis assumir o papel do governo nisto de esmifrar mais uns dinheiros aos bolsos, já de si vazios, do Zé Pagante. Nada que se estranhe quando a mesma personalidade, em plena Assembleia da República, não se lembrava de ter pago duas vezes à Lusoponte… Atitudes destas têm trazido, aliás, mais uma expressão que, não tarda, se há de tornar chavão e que se resume a um “forte com os fracos e fraco com os fortes”.
Espera-se que, com tanta ânsia de, por todos os meios inventados ou a inventar, o governo nos ir depauperando as economias, também nesta área dos combustíveis, tal não conduza ao “deitar gasolina no lume”…
Por: Norberto Gonçalves