A Revolução industrial está intimamente associada ao aparecimento das primeiras coletividades em Portugal. Com efeito, em finais do século XVIII nascem as associações de socorro mútuo, assentes em princípios de solidariedade, estendendo-se rapidamente à criatividade e às artes. A sua evolução passa por quatro fases distintas: Monarquia Constitucional, 1ª República, Estado Novo e 25 de Abril.
Segundo Edgar Rodrigues, «o que valeu aos portugueses para não serem dizimados pela febre-amarela em 1856 foram as 85 mutualidades de assistência social». A origem de inúmeras escolas na 1ª República prende-se com a existência de associações populares para se entender que durante a ditadura existiu uma interligação entre Estado e a sociedade organizada, havendo polos de resistência anti-fascista num processo, mais ou menos livre, com direito à reunião, eleição e opinião. O Estado reconheceu em 1976 a autonomia do movimento associativo, sendo este o verdadeiro pilar de democratização num aumento generalizado de coletividades de cultura, recreio e desporto.
Segundo a Confederação Portuguesa de Coletividades de Cultura, Recreio e Desporto, existem no nosso país mais de 18 mil associações abrangendo um universo de 3 milhões de associados com mais de 250 mil portugueses a exercer funções dirigentes, criando 30 mil postos de trabalho diretos, demonstrando assim a forma de estar e de pensar de mais de um terço da sociedade, tornando o nosso país num dos exemplos daquilo que é o efetivo movimento associativo.
No concelho da Guarda, fruto de vários fatores, a que não é alheia a forte componente republicana, posteriormente aliada a uma oposição vigorosa ao regime fascista, o movimento associativo é deveras interessante, constituindo-se de forma substancialmente diferente, sendo também um verdadeiro exemplo daquilo que é toda a riqueza associativa, seguindo o exemplo nacional, havendo assim mais de um terço da população a assumir postura de grande responsabilidade e participação.
O movimento associativo vive nesta altura um dos seus piores momentos: falta de novas boas vontades e um apoio que tarda em chegar. Percebendo isto, a Câmara Municipal da Guarda apresentou na passada sexta-feira um esboço de Regulamento que intitulou “Apoio ao Movimento Associativo, Cultural, Recreativo e de Lazer do Concelho”, necessitando, naturalmente, do valioso contributo das associações a fim de melhorar este documento e onde a verba a atribuir (200 mil euros), sendo a possível, segundo o presidente Álvaro Amaro, é de certo insuficiente para um apoio efetivo a todo este mundo do associativismo, pese embora nenhuma coletividade concelhia tenha a perceção de ser exclusivamente subsídio dependente.
No exato momento em que cada vez mais assistimos a um distanciamento da população em relação ao poder político, torna-se urgente e imperioso envolver a população num processo de cidadania e participação, percebendo-se que só o movimento associativo está em condições de o fazer, contribuindo desta forma para o aprofundamento de uma sã convivência democrática neste pequeno recanto à beira mar plantado. E para quem entra neste mundo é difícil sair. Porque é bom. Realiza o ser. A prática é saudável e quando se sabe estar, não se pede nada em troca, luta-se diariamente por aquilo em que se acredita, embora não se vislumbre a sua completa consolidação e se perceba que no Portugal de Abril exista ainda um longo caminho que está por percorrer.
Por: Albino Bárbara