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As Responsabilidades do IPG

Dizem-me que cada estudante do Instituto Politécnico da Guarda deixa por mês na cidade, em despesas várias, mais de quinhentos euros. Se o IPG tivesse cinco mil alunos, como chegou a ter, isto representaria mais de dois milhões e quinhentos mil euros mensais. Alimentação, rendas, livros e material escolar, tempos livres, roupas. O comércio da cidade depende hoje do IPG e a construção civil continua a encontrar aí pretexto para continuar a oferecer apartamentos ao mercado. Cada aluno a mais no politécnico, por outro lado, é mais um argumento junto do Ministério da Educação para continuar a garantir o financiamento das várias escolas e a manutenção dos seus postos de trabalho directos, entre professores e funcionários administrativos. Destes, e dos alunos, depende por isso a subsistência de boa parte da cidade. Por isso, e peço desculpa de ter de o repetir, é bom para a cidade que o IPG tenha muitos alunos e é mau para a cidade que esses alunos se vão embora.

Mas é mau também para a cidade que o IPG não tenha um papel mais interventor, por exemplo junto das empresas, onde poderia oferecer investigação e desenvolvimento (e vantagens competitivas) de qualidade universitária. Conhecem-se projectos e trabalhos de qualidade, como por exemplo o do Professor Luís Figueiredo, da ESTG, que conseguiu desenvolver um sistema integrado de hardware e software capaz de permitir a um tetraplégico a capacidade de, por exemplo, aceder à internet, escrever um texto ou, através da domótica, acender e apagar luzes, aquecedores e outros aparelhos. É no entanto lamentável que, no último Expresso, apareça uma reportagem com algum destaque sobre um investigador estrangeiro que trabalha em algo semelhante, com muito menos resultados, sem se mencionar o trabalho de Luís Figueiredo. A pergunta óbvia é: que tem feito o IPG para divulgar devidamente o que de bom se tem feito entre as suas paredes? (uma excepção de aplaudir é uma notícia recente sobre prevenção de fogos florestais em cooperação com Espanha).

A verdade, é que o Politécnico da Guarda insiste em ser notícia pelas piores razões: inúmeros processos em tribunal, eleições com resultados viciados, diminuição sistemática e grave do número dos seus alunos (com consequências desastrosas para a própria cidade), perda de prestígio junto da comunidade universitária. Mesmo as boas notícias têm ali o seu lado negro. O Professor Luís Figueiredo, de que falei acima, viu a sua nomeação definitiva aprovada por uma unha negra. Houve professores que, a coberto do anonimato, votaram contra ele (imagino, perdoem-me o sarcasmo, que estejam a preparar em segredo a cura contra o cancro, ou a fusão a frio, ou qualquer estrondosa descoberta merecedora do Nobel). Pior ainda do que tudo isto, que merece explicação no mau feitio de meia dúzia de personagens, temos outra coisa: o IPG não é neste momento, nem de perto nem de longe, uma referência de qualidade no ensino superior português. (Se estou errado, provem-mo, por favor).

Posto isto, nós, cidadãos da Guarda, temos neste momento dois desejos contraditórios entre si. Por um lado, queremos que venham de fora para a cidade, cada vez mais estudantes. Precisamos deles como do pão para a boca. Com a Delphi em dificuldades, com o encerramento cada vez mais previsível de cada vez mais serviços, não podemos dar-nos ao luxo de perder a fonte de empregos e o fluxo de dinheiro que o IPG representa. Temos também, e este é mais inconfessável, outro problema: queremos que os nossos próprios filhos frequentem este IPG?

SUGESTÕES

Um livro: O Livro Negro da Condição das Mulheres (dirigido por Christine Ockrent, Círculo de Leitores, 2007). As mulheres são hoje a maioria dos estudantes universitários, preparam-se para dominar a magistratura e outras profissões anteriormente reservados aos homens. É um bom momento para recordar como tudo era dantes, no tempo em que elas não podiam nem votar e eram propriedade dos maridos.

Uma provocação: http://www.venganza.org/ (a Igreja do Monstro de Esparguete Voador, uma teoria alternativa à do “desígnio inteligente” e, segundo muitos, com pelo menos a mesma validade científica). Divirtam-se (ou revoltem-se).

Por: António Ferreira

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