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Arte & Dinheiro

Opinião – Ovo de Colombo

Nas últimas semanas têm surgido vários textos, em publicações internacionais, dando conta dos recordes conseguidos nos últimos leilões de arte contemporânea e debatendo argumentos sobre a rentabilidade dos investimentos em obras de arte. Quando vários indicadores económicos parecem querer convencer que estamos a superar a crise, o mercado da arte dá um empurrãozinho, levando os leiloeiros das grandes casas internacionais a esfregarem as mãos de contentes. É que no passado dia 12 de novembro, o leilão de arte contemporânea da Christie’s, em Nova Iorque, alcançou os $691,583,000, quebrando o record total para uma sessão de leilão, bem como o record para a obra de arte mais cara vendida em leilão – o tríptico Três Estudos de Lucian Freud (1969) do pintor britânico Francis Bacon por $142,405,000 – e a obra mais cara em leilão de um artista vivo – Baloon Dog (Orange) do norte-americano Jeff Koons por $58,405,000.

O que surpreendeu o mundo da arte não foi tanto o valor atingindo pelas três grandes telas de Francis Bacon – autor pertencente ao top 10 das obras mais caras, com outro tríptico de 1976 (vendido em 2008 por $86,281,000) –, mas o valor alcançado pela obra de Jeff Koons: uma escultura (de uma série de cinco em diferentes cores) em aço polido com a forma de um cão realizado com balões, de um artista associado ao universo visual do kitsch, do sexo e da fama, e que apropria a imagética popular para criar obras que geram controvérsia. Se olharmos para as 10 obras mais caras de sempre e para os últimos leilões de arte moderna e contemporânea, concluímos que – como aliás é habitual – em tempos de crise (também de valores e de mentalidades), são os clássicos, os artistas incontestáveis, os que o mercado considera como valores seguros e que alcançam os montantes mais elevados (Edvard Munch, Pablo Picasso, Alberto Giacometti, Andy Warhol). E não precisamente Jeff Koons.

Mas o que realmente se pode concluir desta euforia dos números das obras de arte é que se está a atravessar uma certa febre compradora, com vários bilionários a permitirem-se o luxo de adquirir peças de artistas sonantes, favorecida pelo ávido desejo de cada leiloeira poder reclamar um novo record, e com isso uma grande dose de repercussão mediática, geralmente sem análise aprofundada. Não se explora, portanto, o facto de haver uma grande rotação das obras que aparecem em leilão – os supostos colecionadores investidores não as conservam durante muito tempo –, de muitos lotes serem rematados pelo limite inferior previsto e outros serem retirados (ou porque não se vendem ou porque são negociados privadamente, como acontece com metade das obras). Tudo aponta então para um bom momento do mercado internacional das obras de arte, encabeçado pela arte contemporânea. É só pena que tudo isto pertença a outro planeta e que, aqui no nosso, onde (sobre)vivem os nossos artistas contemporâneos, a realidade seja bem diferente.

Tânia Saraiva*

* Historiadora e crítica de arte; professora universitária

Jeff Koons, 

Sobre o autor

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