A Feira de São Bartolomeu, em Trancoso, começa hoje e este ano terá um espaço dedicado ao setor agrícola. Em entrevista a O INTERIOR, o presidente do município, Amílcar Salvador, revelou que esta é uma área importante que o município pretende continuar a apoiar. A iniciar com a presença do “Verão Total” da RTP, o evento começa hoje, quinta-feira, e encerra a 23 de agosto com uma Feira Agropecuária.
P – Este ano, a Feira de São Bartolomeu inclui, pela primeira vez, um espaço dedicado ao setor agrícola. A que se deve esta opção?
R – A Câmara Municipal tem procurado apoiar um setor extremamente importante, neste caso, o setor primário, através da pecuária, uma vez que Trancoso sempre teve feiras de gado muito importantes e também com a Feira da Castanha, uma fileira em que temos apostado. Assinámos recentemente um protocolo com a UTAD, que prevê que nos próximos três anos os nossos produtores de castanhas sejam apoiados no terreno, com análises aos solos, visitas aos soutos, plantações novas, tratamento de outros soutos e podas. É uma aposta clara que nós queremos fazer no setor primário, daí termos lançado este desafio, em parceria com a AENEBEIRA, para termos um espaço relacionado com a área agrícola. Estarão patentes apenas alguns exemplares de plantas, o castanheiro, a oliveira, a videira e também algumas hortícolas. É, no fundo, um espaço que poderá não ser muito grande mas creio que vale a pena.
P – E a aposta na Feira do Gado, que realizaram no ano passado pela primeira vez, vai repetir-se este ano também?
R – Sim. Quando as coisas correm bem não vale a pena alterar muito. O figurino é muito semelhante ao do ano passado mas introduzimos algumas novidades. Vai chamar-se Feira Agropecuária de Trancoso e será muito mais forte. Todo o espaço de mercado de gado vai ter muitos animais, com algumas raças autóctones de bovinos e caprinos de produtores locais. O pavilhão dos bovinos terá, seguramente, 50 a 60 animais. Haverá também cavalos, cães da serra, demonstrações de cães pastores, galinhas pedrês e porcos bísaros. Teremos ainda cerca de 15 a 20 stands onde algumas empresas e comércios ligados ao setor agrícola, além da Cooperativa Bandarra.
P – Qual é a sua expetativa para esta edição da feira?
R – A Feira de São Bartolomeu é, sem dúvida, o maior evento do distrito da Guarda e da região, portanto, as nossas expetativas são elevadas, sempre acima dos 100 mil visitantes. Este ano, não tenho dúvidas que ultrapassaremos esse número, apesar de vivermos numa zona marcada pelo esvaziamento das nossas populações e o despovoamento do interior. No entanto, as expetativas são boas porque temos um excelente cartaz. Vamos começar muito bem com a presença, hoje, do programa da RTP “Verão Total”, que será retransmitido entre as 15 e as 18 horas, e terminaremos com a Feira Agropecuária de Trancoso. Para além disso, temos a tenda eletrónica para os jovens.
P – A Câmara volta a assumir os custos com a animação. Qual é o programa desta edição e quais foram as condicionantes na sua organização?
R – Já sabemos que a Feira de São Bartolomeu é o nosso maior evento, pelo que é onde temos de apostar mais. A situação financeira da Câmara é já sobejamente conhecida e estamos a tentar ultrapassá-la. Este evento representa custos da ordem dos 70 mil euros com os artistas, mais os valores relativos ao palco e som, que rondam os 25 a 30 mil euros. Temos ainda a nosso cargo a vigilância do recinto por uma empresa e da GNR. No total, é um investimento de 100 a 110 mil euros, no mínimo. Este ano há seis dias de bilheteira, que é a única receita que o município tem. Apenas vamos cobrar bilhetes – de 2 euros, um preço simbólico – nas noites mais fortes com as atuações de José Alberto Reis (hoje), António Zambujo (amanhã), Herman José (sábado), Sons do Minho (dia 19), Mickael Carreira (dia 21) e Quinta do Bill (dia 22). Uma das novidades é também as tasquinhas, que este ano aumentaram. Foi o município que procurou fazer com que houvesse mais, de forma a que as pessoas venham à feira para conviver, confraternizar e petiscar. Com estes preços e com cinco dias de entrada gratuita, acho que estão reunidas as condições para que muita gente visite a Feira de São Bartolomeu.
P – Acha que esta é a data ideal para a sua realização?
R – Eu compreendo que isso possa ser um processo de algum diálogo mas quero salientar que este calendário já existe há vários séculos, é uma tradição a feira ir até ao dia 23 ou 24 de agosto. Contudo, temos de refletir sobre um conjunto de situações. Nos primeiros fins-de-semana de agosto todas as freguesias estão repletas de emigrantes e em todas elas há festas populares com alguma importância e significado. Se a feira for alterada todas essas festas poderão ficar um pouco limitadas. Outra questão é que com este calendário o concelho de Trancoso tem atividades praticamente em todo o mês e este ano a Câmara promoveu na noite da passada sexta-feira a animação na Rua da Corredoura e inaugurou o circuito de manutenção no parque municipal no último domingo. A feira começa agora e prolonga-se por dez dias, pelo que qualquer setor, da restauração, alojamento ou outro comércio, tem aqui um mês muito forte. Se a data da feira viesse a ser antecipada corríamos o risco de, a partir do dia 10, 11 ou 12, haver uma quebra das visitas e da animação do município.
P – Na opinião da Câmara, o ideal é sempre organizar a feira a partir desta data?
R – Confesso que temos ponderado muito, mas, tendo em conta os prós e contras, creio que é a data mais favorável para todos os trancosenses.
P – Nesta altura do ano não há acontecimentos do género na região. Esta será, portanto, uma boa ocasião para se vir a Trancoso?
R – Precisamente. Na região não há grandes feiras ou eventos, ou, pelo menos nenhum deles que se possa comparar com este. Portanto, teremos aqui gente de todos os concelhos vizinhos. Neste caso, acho que esta é a data ideal e iremos mantê-la. Viseu antecipou a Feira de São Mateus e faz-nos alguma concorrência, mas vamos procurar manter a data e dinamizar Trancoso nesta altura do ano.
P – Numa altura em que Trancoso tem mais visibilidade, esta é também uma oportunidade para o município tentar atrair investidores? Como estão nessa área? Há novidades em termos de investimentos futuros?
R – Sim. Eu sempre considerei duas situações diferentes. A situação financeira do município, que é grave. Outra corresponde às potencialidades que o concelho tem. Há ainda muito a explorar em Trancoso e não tenho dúvidas que há muitos negócios que poderão aparecer e ser bem-sucedidos. Trancoso tem uma localização geográfica extraordinária, uma tradição em feiras e mercados como não há na região, excelentes acessibilidades, estamos ligados por autoestrada ao norte do país, a Lisboa, ao Porto, a Madrid. Também temos alguns trunfos em termos de património histórico, cultural e monumental, com o parque municipal, as muralhas medievais, o castelo, a albufeira da Teja, o castelo de Moreira de Rei, Vila Franca das Naves e uma estação de caminho-de-ferro. Na indústria existe um conjunto de empresas de relevo como a Casa da Prisca, a Lactovil, a Lactoserra, a Adega Cooperativa de Vila Franca das Naves. Há uma quantidade enorme de turistas, que têm vindo a crescer pouco a pouco. Os próprios empresários da área da hotelaria e restauração nos vão dizendo que são cada vez mais as pessoas que vêm a Trancoso. Há, de facto, perspetivas que novos negócios possam aparecer e o município estará sempre disponível para os apoiar. Em ano e meio abriram 13 ou 14 casas comerciais na cidade, o que é muito em tempos de crise. A Câmara fica muito satisfeita e estamos cá para apoiar porque o mais importante é a criação de postos de trabalho com aquilo que temos.
P – São sempre investimentos sobretudo assentes na valorização dos produtos endógenos?
R – Exato. Estamos atentos e temos noção das nossas potencialidades no âmbito do património, do setor primário e secundário. Para além destes, nenhum serviço público foi encerrado ao longo deste ano e meio em que nós estamos na Câmara. Fomos sempre uma voz firme na defesa do interior e dos serviços públicos. Temos a Escola Profissional e a AENEBEIRA é também um parceiro importante e estratégico para o desenvolvimento económico do concelho. Também não podemos esquecer as IPSS, que são extremamente importantes e procuramos trabalhar com elas.
P – Como está a situação financeira do município? Houve melhorias nos últimos dois anos?
R – Fomos fazendo aquilo que se impunha, ou seja, fomos realizando algumas obras, sobretudo as que eram mesmo necessárias, reduzindo simultaneamente a dívida. Em 2014 conseguimos pagar da dívida anterior mais de dois milhões de euros. Este ano, vamos com certeza pelo mesmo caminho, isto sem deixar de cooperar com todas as associações e instituições do concelho. Resolvemos ainda um problema que se vinha a arrastar há vários anos, o do terreno para os bombeiros. Colaborámos com a Comissão Fabriqueira da Igreja de Santa Maria na elaboração de um projeto que submetemos à Direção Regional de Cultura do Centro, mas cuja candidatura apenas foi aprovada com 50 mil euros, o que, sendo pouco, já é uma ajuda. Outra obra foi a melhoria no campo militar de São Marcos, que está com um aspeto diferente e que muita gente vai visitar. Já no bairro da Senhora da Fresta, próximo do cemitério, está a ser construído um parque de estacionamento.
P – Neste momento já se pode falar em contas equilibradas ou ainda não?
R – A situação ainda é grave, sobretudo no campo da parceria público-privada, com nove milhões de euros, e de obras que foram lançadas sem qualquer procedimento. Fizemos uma auditoria técnica às obras cujos resultados serão divulgados em breve.
P – E já são conhecidas as conclusões da auditoria financeira às contas da Câmara que este executivo mandou fazer?
R – A auditoria às contas da Câmara Municipal já foi feita e também será divulgada brevemente, creio que no mês de setembro. Mas a situação, muito mais do que uma questão política, é mais do fórum judicial porque, legalmente, não podíamos fazer esses pagamentos, e nem vale a pena falarmos muito mais.
P – Quais os projetos que quer concretizar nos próximos dois anos?
R – Apesar das nossas dificuldades financeiras, o concelho não parou nem vai parar. Temos alguma expetativa no novo quadro comunitário, o “Portugal 2020”, embora ainda não tenhamos tido nem um cêntimo. No entanto, os projetos mantêm-se, essencialmente a recuperação de algum património, sobretudo na cidade, como a reabilitação da praça municipal, do edifício da Câmara e também do Palácio Ducal. São três obras emblemáticas e que são uma mais-valia para o concelho.
P – O Palácio Ducal foi adquirido pela autarquia, o que pretende fazer ali?
R – Não adiantava andarmos a elaborar projetos para um edifício que não era do município, esse foi o erro que se cometeu durante uma década. Adquirir o imóvel não foi uma decisão fácil, foi preciso ponderarmos muito, mas era um ponto negro no centro da cidade que nos envergonhava a todos. Assim, a 7 de novembro de 2014 fizemos a escritura do espaço, que comprámos por 350 mil euros, e tenho a certeza que foi uma boa compra dado que está num lugar central. Vários empresários já nos perguntaram se é para vender e sei que haveria compradores se quiséssemos vender o edifício por um valor muito superior ao que pagámos. Contudo, sabemos qual é a sua importância para a cidade. Pretendemos fazer ali um espaço de cultura, arte e negócios, criando uma loja do cidadão, um posto de turismo, uma galeria de artes com espaços relativos à batalha de Trancoso, às bodas reais de D. Dinis e a Rainha Santa Isabel e a exposição permanente dos quadros doados ao município por Eduarda Lapa, e ainda outras salas para conferências.
P – Seria uma espécie de Centro Cívico e Cultural de Trancoso?
R – Precisamente. Mas com a possibilidade de espaços de negócio, e também está a ser ponderada a eventualidade de se construir um auditório com lugares significativos, pois é uma lacuna não termos um espaço que possa acolher 200 a 300 pessoas.
P – É um projeto para iniciar nestes próximos dois anos?
R – É um projeto que já apresentámos à empresa que está a elaborar o plano estratégico da CIM e temos esperança que venha a ser comparticipado.
P – E no âmbito da CIM, que projetos candidatou Trancoso? A requalificação do mercado municipal já está a concurso?
R – Na área do património cultural e natural existem vários projetos. Como já referi, um Centro de Interpretação da Batalha de São Marcos, um Centro de Interpretação em Moreira de Rei, um plano de pormenor para a albufeira da Teja, no sentido de criamos um espaço de lazer que permita a visita de muita gente. Na própria cidade há também o mercado municipal, outros espaços antigos das escolas onde funcionou uma antiga cantina. Na zona de Reboleiro e Palhais necessitamos de recuperar algumas das escolas ou pensar até num pequeno centro escolar para servir aquelas localidades e também Rio de Mel. Em suma, há um conjunto de projetos que sinalizámos, mas com um orçamento de 45 milhões de euros a repartir por 15 municípios não sabemos ainda o que nos vai calhar. Mas estou convencido que vai ser tudo reprogramado em breve.
P – Tem-se notado um crescimento do turismo judaico, uma vez que Trancoso tem o Centro de Interpretação Isaac Cardoso e uma judiaria bem preservada?
R – Sim, é também um aspeto importante. Todo o centro histórico de Trancoso tem a parte da judiaria, onde existe esse Centro de Interpretação, o que traz também uma quantidade enorme de turistas judeus e israelitas. O turismo religioso continua a ser muito forte em Trancoso.
P – Ainda no âmbito do turismo, Almeida tem um projeto que está a ter sucesso, a recriação do Cerco de Almeida. Trancoso também teve um acontecimento histórico, a Batalha de São Marcos. A autarquia também pondera fazer uma recriação desta grande batalha para atrair mais visitantes?
R – O campo militar de Trancoso não está esquecido e a Câmara quer dar mais importância e promover mais esse facto histórico que ocorreu a 29 de maio de 1385. Este ano, as comemorações do 29 de maio, que é o nosso feriado municipal, já foram muito dignas, pois tivemos pela primeira vez a presença do Exército. Houve muita gente que nos visitou e esteve no planalto de São Marcos. As comemorações correram muito bem e já estão a ser feitos investimentos para permitir alguns estacionamentos de forma a que as pessoas possam assistir às comemorações do próximo ano. Assim, em colaboração com a Direção Geral de Património Cultural, uma vez que o campo da batalha é monumento nacional, pretendemos requalificar e apostar no planalto em si e na sinalética de indicação do espaço.
P – Como está o protocolo com a Fundação Aljubarrota?
R – Temos mantido contato com o presidente da Fundação e temos solicitado alguma ajuda para a requalificação do campo da batalha. Apesar de ainda não termos obtido esse apoio, as negociações e conversações mantêm-se e penso que o protocolo vai avançar.
P – Como tem sido a adesão aos roteiros e circuitos culturais?
R – Notamos que há mais gente que vem a Trancoso depois do lançamento dos roteiros e dos circuitos culturais. A Câmara terá sempre alguns encargos com a manutenção, limpeza e preservação dos espaços, mas é uma mais-valia. Para além disto, existem as caminhadas que o município tenta organizar em grande número. O balanço que fazemos desses roteiros culturais é muito positivo.