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Altos e Baixos

Quebra-Cabeças

Alto: “O Peregrino”. Agora que perdemos a esperança na classe politica, resta-nos acreditar na energia e no saber dos particulares. Sobretudo naqueles que não ficam à espera dos subsídios e dos “apoios”. É por isso que cada vez me irrita mais ver aquelas partes gagas na televisão do inevitável jovem que quer entrar para o Guinness (uma mania cada vez mais portuguesa) a fazer algo de grotesco, ou inútil, e reclama “apoios” para a façanha. Há quem não precise e se dedique a actividades bem mais nobres e úteis. Fui há umas semanas atrás almoçar ao Restaurante “O Peregrino”, no Alto de Pega, levado pelo Luís Soares. Á entrada, quando vi a sala repleta de gente, disse mal da minha vida e da minha agenda para a tarde. Enganei-me. Assim que apanhámos uma mesa vaga fomos atendidos e, apesar de não pedirmos o prato do dia, estávamos a comer em minutos. E bem. O preço, no final, foi bem abaixo do que esperava (não que importasse muito, que pagou o Luís). Voltei lá hoje apenas para confirmar que é assim mesmo e que continuava a haver casa cheia, serviço eficaz e simpático, boa comida. Aí está, em resumo, a solução para o pais: qualidade, organização, profissionalismo – tudo a um preço justo e sem “apoios” ou subsídios.

Baixo: a TV em formato rasca. Apesar de estarmos quase a meio do mês, qual fruta da época, continua a surgir a pergunta: “então como foram as tuas entradas?” Para satisfazer a curiosidade aos que ainda não tiveram a oportunidade de fazer a pergunta, passo a esclarecer como foi. Estava sentado no meu sofá, numa modorra semi-comatosa, embora agradável, quando fui acordado em sobressalto por um senhor gorducho da TV, com o cabelo pintado de amarelo e ar de bicha, que guinchou e se peidou em directo e ao vivo. Apareceram então na televisão doze garrafas de cerveja, dispostas em círculo, que foram desaparecendo uma a uma. Quando a última desapareceu, regressou ao ecrã o senhor gordo, que se voltou a peidar e começou aos pulinhos. Percebi então, ainda meio estremunhado, que as doze cervejas simbolizavam as doze badaladas e que estávamos já em 2005. Mudei de canal apenas para apanhar outro senhor com maneirismos de bicha e cabelo pintado. Desisti do exercício e regressei ao meu sofá, sem sequer acabar o champagne. Não demorou muito que eu, e suspeito que muitos milhares de outros portugueses, recomeçássemos a dormir.

Baixo: a alternância do bota-abaixo. Como qualquer jogador de xadrez sabe, mais vale ter um mau plano do que não ter nenhum. Cada novo código, cada nova revolução legislativa, cada reforma trazem com as alterações os custos de adaptação do pais à mudança. Serão criticáveis iniciativas, ou aspectos delas, como o sistema SCUT ou o Código do Trabalho. Revogá-las sem mais fica contudo muito mais caro ao pais do que a sua manutenção ou aperfeiçoamento e implica regressar á estaca zero em cada legislatura. Revogar agora o Código do Trabalho é uma irresponsabilidade e só pode prejudicar empresas e trabalhadores, lançando o caos nas relações laborais e esquecendo o muito de bom que ele trouxe: a dificultação, embora subtil, da contratação a prazo (embora a possibilidade do seu prolongamento por seis anos pareça excessiva e possa ser corrigida), a ênfase na formação profissional, a clarificação de alguns conceitos, a simplificação de procedimentos, a codificação em dois diplomas (código e respectiva regulamentação) de matérias anteriormente dispersas por muitos.

Por: António Ferreira

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