Arquivo

Altice e para o baile!

Quando, esta terça feira, os gestores da Altice entraram pela porta da frente do Fórum Picoas, os antigos administradores da Portugal Telecom já terão saído pela porta de trás. Saem indemnizados, porque o mundo às vezes é piedoso com quem não merece, e deixam uma legião de trabalhadores com medo da sombra. Vai ser um choque térmico, numa empresa que mesmo depois de ser majestática continuou a ser majestosa.

Há muito medo da Altice na PT. Percebe-se porquê: a empresa ainda não disse ao que vem mas basta olhar para onde já foi para perceber que cortar custos será o primeiro trabalho de Armando Pereira, o “herói de Vieira do Minho”, como lhe chamou António Pires de Lima, indiscutível apoiante da mudança na empresa. Os administradores e os diretores vão ganhar menos, haverá menos regalias, empresas serão vendidas ou reestruturadas, com o tempo virão os despedimentos.

Não é muito fácil falar da PT sem falar da vergonha que se descobriu no último ano, um ano “negro e vergonhoso”, em que “a destruição de valor levada a cabo pode ser comparada a um ato criminoso”. Não são palavras do Bloco de Esquerda que tem cartazes com as cabeças de Zeinal e Granadeiro nas ruas; nem são palavras da Sonae que perdeu a OPA para comprar a empresa; nem são palavras do BPI que foi afastado pelo BES do poder na empresa. São palavras de um financeiro, raça que normalmente até prefere grandes números a grandes palavras. Disse-as Pedro Lino, administrador da DIF Broker, esta manhã no Negócios – e também trouxe os números, que de grandes passaram a pequenos: a empresa que recusou uma OPA de 11 mil milhões vale hoje 450 milhões. Pfff….

A PT tinha muito dinheiro, gerava (e gera) fluxos de caixa enormes, investia muito, pagava bem, alimentou o monstro Espírito Santo, andou de braço dado com governos, fez negócios inexplicáveis no Brasil e nas gavetas agora fechadas das salas já vazias e nas prateleiras ainda cheias de gente a Altice há de descobrir gastos de pasmar. Esses tempos acabaram, como muitos trabalhadores já perceberam. Parou o baile, um baile faustoso que tinha do melhor lado o investimento em engenharia e do pior lado as operações financeiras. Era, também, um baile de máscaras. E a Altice não vai nisso. Nem, suspeita-se, vai dar um bailinho a ninguém: rapidamente dirá quais são as suas intenções.

Mas depois dos custos virão as receitas. Cortar custos qualquer líder sabe, construir negócio exige capacidade de gestão. É evidente que a empresa quer gerar lucros e pagar o seu próprio investimento, e é evidente que o corte de custos tem como primeiro impacto o aumento das margens. Mas depois tem de existir uma estratégia comercial que faça da “PT boa” uma máquina de crescimento, caso contrário perderá posição competitiva face aos concorrentes.

Sim, esta é a “PT boa”. A “PT má” também existe e chama-se agora PHarol. Amanhã, dia de novos donos, fará precisamente 20 anos desde que foi privatizada em Bolsa. Quando os lisboetas passarem pelo Fórum Picoas talvez não vejam nada de diferente do lado de fora. Mas lá dentro, nos gabinetes do que antes parecia um castelo, não há peneiras nem hábitos de grandeza. Que vier que venha por bem, porque quem esteve deixou muita coisa mal. Afinal, como escreveu Camões num poema que a própria PT citou numa campanha de publicidade, “Todo o mundo é composto de mudança/Tomando sempre novas qualidades.” Assim seja.

Por: Pedro Santos Guerreiro

Sobre o autor

Leave a Reply