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Ainda Cavaco e o BPN

Na semana passada colocava aqui algumas questões que gostaria de ver respondidas para esclarecer em que ponto Cavaco Silva terá agido mal nos negócios das acções que deteve na SLN (Sociedade Lusa de Negócios), proprietária do BPN. Queria saber, por exemplo, o fundamento económico da evolução do preço das acções de uma empresa que nem estava cotada em bolsa, ou pelo menos uma justificação para a valorização de 140% de que beneficiaram em apenas dois anos.

Entretanto, a evolução dos acontecimentos respondeu a algumas dessas perguntas, formuladas de resto por muita gente. Marques Mendes e o jornal O Sol vieram dar uma mão a Cavaco: afinal, tinha vendido as acções baratas. Na mesma altura houve quem tenha recebido ainda mais do que ele. É verdade que poderia ainda haver perguntas sobre o preço de venda e a sua fixação, com pedidos de esclarecimento sobre os respectivos critérios, abrindo-se ainda caminho para especulação sobre a identidade desses vendedores (ainda) mais beneficiados que Cavaco e das suas relações, especiais ou não, com quem tomou a decisão de lhes comprar a esse preço as participações sociais. Assim como poderia ser interessante ver esclarecida a razão de a SLN Valor, adquirente das acções, estar interessada em vê-las regressar à casa-mãe. Mas não vale a pena, que é a montante que vamos encontrar as grandes interrogações.

No mesmo dia em que O Sol ilibava Cavaco, O Expresso revelava que ele tinha comprado as acções ao preço de saldo de um euro cada. A SLN tinha procedido a um aumento de capital, com emissão de novas acções, que suponho corresponderem precisamente a esse aumento de capital, embora a coisa não seja totalmente clara. Foram fixados vários preços para as acções, podendo estas ser adquiridas ao preço de um euro cada pela própria SLN e pelo presidente do Banco, Oliveira e Costa. Os outros accionistas pagaram-nas a €1,80 ou €2,20 cada unidade. A SLN poder adquiri acções próprias a esse preço é compreensível, embora possa ser criticável, uma vez que pode revelar que se pretendia tornear a proibição para as sociedades anónimas de manutenção de uma participação no capital próprio superior a 10% – ou então, mais simplesmente, que se quereriam realizar posteriormente importantes mais valias e um novo aumento de capital. O preço oferecido a Oliveira e Costa tem também fácil explicação. É mais do que frequente as grandes empresas premiarem os seus gestores com stock options, que mais não é do que dar-lhe a opção de compra de acções da empresa a valor inferior ao corrente no mercado. A acreditar que o preço fixado para a generalidade dos accionistas era justo, então Oliveira e Costa, no mesmo dia em que comprou as suas acções por um euro, tinha garantido um lucro de oitenta cêntimos, pelo menos, por cada uma que decidisse vender.

Incompreensível, inaceitável, é que Cavaco tenha beneficiado de um preço claramente remuneratório quando não havia nenhuma razão para ser remunerado. Recordo que o BPN, cujos resultados influenciavam o valor das acções da própria SLN custou aos contribuintes portugueses qualquer coisa entre 2 e 5 mil milhões de euros – e ainda não acabou. Ser Cavaco um dos poucos portugueses que aí ganhou dinheiro da maneira que vimos e nada de útil esclarecer sobre o assunto é pelo menos constrangedor.

Por: António Ferreira

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