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Ainda as maternidades

Como é triste ouvir falar quem não sabe

A recente polémica ao redor das maternidades da Beira Interior foi acesa pela carta que um grupo de médicos do hospital da Guarda decidiu enviar ao primeiro-ministro em Setembro passado.

Não foi preciso esperar muito tempo para se perceber o incómodo que tal iniciativa provocou em alguns militantes socialistas cá da terra (incluindo alguns efémeros membros do próprio conselho de administração do hospital), em plena época pré-eleitoral. Isto de se pedir a um político, ainda por cima com responsabilidades governativas, que seja claro, que diga o que pensa, ou que diga que nada pensa, é uma afronta que não se faz a ninguém, muito menos ao grande líder.

A realidade é que o problema das maternidades da Beira Interior – sim, porque é de um problema que se trata – para além de ser político, é técnico e mexe com a vida e com o futuro de milhares de pessoas. Este facto impede que seja tratado com leviandade, amadorismo ou cegueira partidária.

O senhor governador civil, logo que tomou posse, decidiu manifestar-se publicamente acerca não só da iniciativa dos médicos, como das próprias condições em que a maternidade da Guarda funciona. Fê-lo após quatro visitas que afirma ter feito ao serviço nas quais, segundo consta, distribuiu flores, beijinhos, sorrisos e votos de boas festas.

É pouco, muito pouco, para que se possa sentir habilitado a botar opinião acerca de um tema tão complexo e delicado.

Não haja confusões: a pertinência política deste assunto (ou, já agora de qualquer outro) não pode ser confundida com tenesmos partidários e a oportunidade do envio da carta (em período pré-eleitoral) é da única responsabilidade dos subscritores, por muita azia que tenha causado aos politicamente dependentes do primeiro-ministro, como é o caso do senhor governador civil ou de alguns cromos que por aí (ainda) gravitam.

Seja qual for a natureza das preocupações dos médicos (viabilidade da maternidade da Guarda a prazo num universo de 3 unidades num tão escasso perímetro, número e média etária dos médicos do serviço, deslizamento galopante do número anual de partos, falta de idoneidade do serviço para formar especialistas ou falta de capacidade de aliciamento de jovens profissionais, só para citar algumas), dificilmente se pode aceitar que se tomem como prioridade na abordagem do tema as conveniências ou inconveniências para o partido A ou para o partido B em período pré-eleitoral.

Senhor governador civil, V. Exa. entrou nitidamente com os pés. Pés políticos, naturalmente.

António Matos Godinho, Guarda

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