Boa parte das guerras na Unidade Local de Saúde da Guarda têm partido do pressuposto de que ali é aplicável o mesmo regime que aos funcionários públicos e para todos os efeitos: contratação, regime disciplinar, progressão na carreira, retribuições e despedimentos. A ULS é uma pessoa colectiva pública, mas de natureza empresarial. Se é verdade que os seus trabalhadores que eram funcionários públicos à data da sua criação puderam continuar com esse estatuto, sobretudo para efeitos de vinculo ao Estado, é mais verdade ainda que essa situação é claramente transitória e que o regime pretendido pela lei e que rege o pessoal é o do Código do Trabalho (art.º 12.º do Decreto-Lei 183/2008, que criou entre outras a Unidade Local de Saúde da Guarda).
Há algumas reservas, contudo. No processo de recrutamento de pessoal tem de haver respeito pelos mesmos princípios que regem o recrutamento na administração pública, mas o processualismo é totalmente diferente e muito simplificado. Basta respeitarem-se, essencialmente, as regras da adequação do pessoal contratado à função, da igualdade de oportunidades no acesso ao emprego ou a publicidade da intenção de contratação.
Se os portugueses e os seus legisladores não desconfiassem tanto uns dos outros, teriam deixado maior margem ao bom senso e mais possibilidades à administração (em geral) de agir de acordo com critérios de pragmatismo. Não é nem será tão cedo assim. Para se defender, o legislador preferiu as progressões automáticas, a supremacia da antiguidade, um labirinto de regras, de sub-regras, de alçapões misteriosos e enigmáticas nulidades, anulabilidades e irregularidades que se para alguma coisa servem é para dar dinheiro a ganhar aos advogados. Pela parte que me toca, como advogado, obrigadinho, mas reconheço que se está a ir longe demais.
Mas isto é para a administração pública, que para as ULS falamos de Código do Trabalho e poder de direcção do empregador, no sentido em que é o patrão quem escolhe, de acordo com os seus próprios critérios empresariais, quem vai ser, por exemplo, o chefe de cada secção ou serviço.
Lamentável é isso não ser entendido quando é tão fácil de entender. Foram anos e anos, infelizmente, em que no Estado se progredia ou automaticamente ou com base em critérios partidários. Num caso e no outro o resultado era, e é, em geral, o da protecção dos incompetentes e dos medíocres. Seria muito melhor para todos se as administrações das empresas de capitais públicos se fixassem no que é essencial em sede de recrutamento e deveria predominar sobre o resto: garantir que em cada lugar é colocado o trabalhador mais competente para o desempenho da função.
Por: António Ferreira