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Acusação e Ministério Público pegam-se no julgamento de Cruz Ribeiro

Divergências e declarações polémicas marcaram alegações finais no Tribunal da Guarda

O Ministério Público (MP) e a defesa pediram na semana passada a absolvição do ex-comandante de destacamento da Brigada de Trânsito da Guarda no caso da máquina fotográfica, alegando não existir «um único elemento de prova» de que Cruz Ribeiro tenha beneficiado o infractor e lesado o Estado quando não apreendeu o veículo de um cidadão brasileiro, multado no IP5, e deixou-o seguir viagem sem ter pago a coima. O agora major Cruz Ribeiro está a ser julgado no Tribunal da Guarda pelos crimes de denegação de justiça, prevaricação e peculato por ter aceite uma máquina fotográfica como garantia do pagamento da contra-ordenação, o que nunca aconteceu tendo a mesma sido liquidada por um elemento da GNR, supostamente a mando do então capitão, como ficou provado em sede de audiência. Durante as alegações finais, na passada quarta-feira, a acusação defendeu a condenação do oficial.

Numa intervenção longa e polémica, o procurador-adjunto Avelãs Nunes começou por criticar a comunicação social que tem acompanhado o julgamento, brandindo um exemplar de “O Interior”, que acusou de causar «danos irreparáveis» ao major, actualmente sub-comandante regional da BT de Lisboa. Mais adiante invocou o caso do cônsul Aristides de Sousa Mendes, que «também desobedeceu à lei e prevaricou» quando ajudou os judeus em Bordéus, para sustentar que a decisão de Cruz Ribeiro foi «humanitária e justa». Quanto ao facto de ter sido enganado por Átila Sbruzi – que, ouvido em videoconferência na penúltima sessão, confirmou ter mentido aos agentes da BT para poder seguir viagem – o MP comparou a situação à dos juízes quando julgam com base em depoimentos falsos. «Nesses casos, também os magistrados seriam uns prevaricadores continuados», sentenciou, sustentando que a conduta do então comandante de destacamento da BT foi legal, pois não podia apreender o veículo do cidadão brasileiro por não ser pertença do infractor. Alegações que David Catana, advogado de acusação em representação do sargento Paulo Costa, assistente no processo, não gostou de ouvir e rebateu duramente.

«É mais fácil condenar um soldado que um oficial»

O causídico confessou-se «incomodado» com a posição do MP, «nitidamente em defesa do arguido» e contra as conclusões do Procurador do Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Coimbra, que lavrou o despacho de pronúncia. David Catana explicitou que o que está em julgamento é o facto do comandante de destacamento não ter cumprido a lei. «O major Cruz Ribeiro confirmou que Átila Sbruzi se foi embora, anuiu em ficar com a máquina em vez do pagamento e que foi ele quem decidiu», sublinhou, não tendo dúvidas que o oficial sabia que tinha que apreender o veículo – como mandava a lei em vigor – e que «beneficiou incontestavelmente» o infractor quando o deixou seguir viagem. Por tudo isso, a acusação considera que ficou demonstrada a prática do crime de prevaricação agravada. «Só não prejudicou o Estado porque pagou a multa», acrescentou, admitindo que a decisão do tribunal vai ser «importantíssima»: «É que se o comandante pode cumprir a lei por ser livre arbítrio, então os soldados da GNR também». O advogado considerou ainda que «é mais fácil condenar um soldado que um oficial», pois é «o sistema que está em causa», mas estranhou que os polícias «andem a pagar multas» dos cidadãos e que a GNR tenha usado durante oito anos uma máquina fotográfica pertença de um condutor contravencionado sem fazer referência dela aos seus superiores.

O advogado de defesa corroborou as alegações do MP e recordou que vários processos disciplinares e administrativos a propósito desta matéria foram arquivados. «Não há nada assinado por Cruz Ribeiro, que apenas apoiou os seus homens. Não sei como factos imputados a outros têm a ver com o arguido», disse, pedindo a absolvição. No final da sessão, o agora major usou da palavra para dizer que «teria sido mais fácil não exercer o comando, mas apareci e participei na decisão, como era meu dever». O ex-comandante da BT da Guarda disse ainda esperar que o condutor «se arrependa do que disse e peça desculpa à Brigada de Trânsito». A leitura da sentença está marcada para dia 9. À margem da audiência, o sargento Paulo Costa mostrou-se revoltado com o rumo do julgamento e revelou que o comando da GNR não tem respondido aos seus pedidos de reintegração na BT: «Preferem ter um oficial suspeito do que o denunciante de um crime», lamentou.

Luis Martins

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