Os responsáveis da Águas da Covilhã (AdC), empresa de âmbito municipal, estão preocupados com o abastecimento da população a curto prazo. Em causa está a fraca pluviosidade registada até ao momento e o facto da barragem, na Serra da Estrela, que serve a região estar apenas com 20 por cento da sua capacidade, «o pior registo desde 2005», avisam. A solução reside na construção de outra infraestrutura, mas o projecto está longe de gerar consenso.
«Apesar de apenas um terço do concelho da Covilhã ser abastecido pela Barragem do Viriato, precisamos de alargar a área de influência do abastecimento de águas superficiais e, para tal, precisamos de construir uma nova barragem», garante José Calmeiro. O administrador lembra, no entanto, que o processo de construção da barragem da Ribeira das Cortes, também na Serra da Estrela (freguesia de Cortes do Meio), tem sido «acidentado». O empreendimento que é visto como uma «necessidade», já que permite o armazenamento de mais dois milhões de metros cúbicos de água, começou por ser sujeito a um processo de avaliação de impacto ambiental, sendo emitida uma declaração pelo secretário de Estado do Ambiente, a 15 de Setembro de 2006. Seguiu-se o desenvolvimento do projecto, que necessitava de prospecções geológicas e ensaios laboratoriais, interrompidos pelo proprietário de uma «“casa de férias”» situada nos terrenos da futura barragem.
O diferendo arrastou-se e o prazo para a execução do projecto expirou, tendo a AdC solicitado a sua prorrogação em Setembro do ano passado. «Houve depois uma audiência entre o proprietário da casa e alguém do gabinete de secretário de Estado do Ambiente e o dossier foi reaberto», explica José Calmeiro. No entanto, o proprietário pretende classificar a área – designada de “Tapada do Dr. António” – por conter levadas de água antigas, uma situação que a empresa considera «caricata». «Depois de um instituto público, como o IGESPAR (Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico), ter dito que não havia nenhuma classificação a decorrer na zona, o director desse organismo veio afirmar que tinha havido um lapso e que tinha que se reabrir o processo», critica o administrador, lamentando «mais um compasso de espera». Até porque «há uma preocupação crescente em relação ao abastecimento de água no concelho e, em Dezembro, podemos ter que o reduzir a duas horas de água se a situação da pluviosidade se mantiver», avisa.
«Se não fosse assim, se calhar aguardaríamos mais algum tempo para que os processos decorressem», diz. Relativamente ao imóvel, José Calmeiro lembra que se trata de «uma casa que não tem mais de duas décadas», tendo sido proposto ao proprietário uma indemnização e um processo de expropriação «para uma zona à sua escolha», adianta. «Há aqui questões que não compreendemos, nomeadamente a desigualdade de tratamento entre este caso e os projectos das barragens da EDP, cujos processos são altamente céleres», compara. Na Covilhã, o projecto da barragem foi candidatado ao Programa Operacional de Valorização do Território (POVT), mas a candidatura também está suspensa por causa dos problemas no terreno. Fonte autorizada do IGESPAR disse a O INTERIOR que o lapso ficou a dever-se ao facto do requerente [dono do imóvel] «ter contactado directamente com a entidade, tendo esta definido através dos seus técnicos que não haveria motivo para classificação». O processo deveria ter passado pela Direcção Regional de Cultura do Centro, que se queixou e travou os procedimentos seguintes.
«A lei não diz que o IGESPAR não pode actuar directamente quando recebe um processo, mas há procedimentos internos que têm que ser respeitados», acrescenta a mesma fonte. No entanto, «esta situação ocorreu porque, no meio de tantos casos, o director do IGESPAR viu um parecer dos seus técnicos a dizer para não se classificar e a direcção despachou para que fosse a Direcção Regional de Cultura a tratar do processo», refere. Actualmente, o dossier está em estudo por esta entidade.
Proprietário não cede terreno para construir nova barragem
Em declarações ao jornal “Público” (ver edição de 25 de Outubro), um dos proprietários da casa, Luís Alçada Baptista, mostra-se irredutível, alegando que o imóvel «foi palco da vivência incontornável da cultura contemporânea portuguesa que envolveu a família Alçada Baptista». Na mesma edição, o presidente do Centro Nacional de Cultura, Guilherme Oliveira Martins manifesta a sua «preocupação com a destruição deste marco fundamental do século XX português».
Rafael Mangana