Os serviços que em Portugal designamos como serviços de urgência são sobretudo serviços de atendimento permanente, que correspondendo a cerca de 75%, me permite afirmar que apenas 25 % dos serviços são de verdadeira urgência/emergência. O que é francamente demonstrativo de uma realidade desajustada das verdadeiras necessidades das populações. Pois esta realidade, a meu ver, traduz claramente as grandes dificuldades dos portugueses no acesso ao médico de família, às consultas externas hospitalares e aos meios de diagnóstico e tratamento, fazendo com que, o actual modelo de organização e funcionamento destes serviços constitua a válvula de escape do real e precário modelo organizativo do Serviço Nacional de Saúde de hoje. Levando desta forma, a que este modelo, para além de absorver horas de trabalho de técnicos de saúde como médicos e enfermeiros, de forma muito pouco eficaz, e consequentemente pouco produtiva, leve também ao aumento excessivo do consumo de medicamentos e ao recurso também excessivo de meios de diagnóstico. Estimulando e favorecendo assim, a própria indisciplina do Sistema Nacional de Saúde e não resolvendo os verdadeiros problemas da acessibilidade das pessoas/doentes.
Ninguém duvide que é fundamental proceder a uma reforma do Serviço Nacional de Saúde e a uma requalificação das Urgências do nosso País, dado que alguns serviços estão de tal modo obsoletos que melhorar o desempenho assistencial neste domínio é uma prioridade no sector da saúde.
A confusão de conceitos, entre o que é uma Consulta e um Serviço de Urgência, tem motivado declarações não exactas, invocando o encerramento de Serviços de Urgência em determinados locais, quando na realidade nesses locais nem sequer existem verdadeiros Serviços de Urgência em funcionamento. Esta confusão talvez sirva alguns interesses sectoriais e políticos mas é enganador para as populações que assim pouco esclarecidas, de forma fácil são chamadas a engrossar manifestações de protesto. Há que ser sério na defesa das populações, preconizando as melhores soluções técnicas, independentemente das conveniências políticas e da popularidade imediata das soluções.
O jornalismo começa a pecar pelo exagero pretendendo diariamente dissimular o imparcialismo com notícias sensacionalistas, alarmistas e por vezes mesmo falaciosas, não contribuindo em nada para melhor informar as populações, apenas agravando assim os seus sentimentos de insegurança. O debate em torno do fecho das urgências é necessário para envolver as populações, mas a polémica é nefasta. A informação tem que ser total e imparcial, mostrando toda a verdade com os possíveis aspectos mais ou menos positivos. E não apenas divulgar episódios isolados, muitos deles de causalidade inimputável ás reformas e que infelizmente continuaram a suceder, independentemente do melhor sistema de emergência que tenhamos no futuro, como o foi o recente e badalado caso da morte de um bebé de três meses em Anadia.
No meu entender, em nenhuma circunstância constitui o processo de requalificação das urgências um atentado ao Serviço Nacional de Saúde. Este, antes pelo contrário, representa uma tentativa da sua estruturação, num sector de actividade importante, a favor do bom funcionamento dos serviços. E o que se está a tentar fazer neste momento é algo que já foi adiado muitas vezes por diversos governos. E se nada se fizer o Serviço Nacional de Saúde poderá num futuro próximo colapsar, pois o sistema tal como existe, não está a ser capaz de corresponder às expectativas das pessoas. E por isso as pessoas recorrem ao serviço de urgência e vem-no como a única solução segura.
Nenhuma reforma, por mais benéfica que seja, agrada a todos, mas a forma como ela é primariamente transmitida é de vital importância em política. Sendo para mim claro que o direito de protesto é o mais legítimo que existe, e não me competindo avaliar a qualidade e o rigor científico do estudo da Comissão Técnica de Apoio à Requalificação das Urgências, muito menos a sua aplicação prática. É infelizmente para mim demais evidente, ter havido uma grande falha de comunicação por parte do Ministro da Saúde Correia de Campos, no que concerne á qualidade da informação, que fazendo transparecer uma carente definição das linhas de acção e a sua desajustada temporização de exposição, limitou e limita hoje, na essência todo um efeito positivo que esta requalificação poderia ter, se bem apresentada. Resta-nos agora esperar que a nova Ministra da Saúde Ana Jorge saiba melhor explicar aos portugueses a necessidade das reformas e seja capaz de por em prática as políticas necessárias e urgentes no sector. Pois é para todos nós obvio que a reforma é necessária, mudar é difícil, mas não mudar pode ser fatal! E eu, assim como muitos outros, acredito que estas reformas não são para desestruturar, mas sim para salvar o Serviço Nacional de Saúde.
No que a nós mais diz respeito, falando agora da nossa realidade local. O hospital da Guarda necessita urgentemente de ser requalificado e a maioria dos SAPs do distrito, embora a aguardar ordem de encerramento no período nocturno, continuam em funcionamento, não sendo assim sentidas recentes contestações. Gouveia e Pinhel, embora com novas instalações construídas, mantêm os seus Centros de Saúde a funcionar em instalações há muito precárias, encontrando-se mesmo os utentes em Pinhel a ser atendidos em contentores e em velhas instalações com graves problemas eléctricos. Mas de dizer que por Seia as novas instalações do Hospital se encontram em bom ritmo de construção e o serviço de ambulância SIV – Suporte Imediato de Vida já se encontra no terreno em pleno funcionamento, enquanto por terras de Foz Côa o projecto da futura Urgência Básica vai devagar ou mesmo parado.
Acreditando no projecto Unidade Local de Saúde do Distrito da Guarda, é imperioso e urgente a sua célere implementação, pois a meu ver, ele trará as soluções necessárias á resolução dos problemas de Saúde do nosso distrito, se formos capazes de com ele impor uma dinâmica de melhor articulação entre os cuidados de saúde primários e os hospitalares.
E se todos bem estão recordados, no final do corrente mês é chegada a data prevista e exigida pelo anterior ministro da Saúde para apresentação dos estudos de suporte para a constituição e operacionalização da ULS como EPE. Querendo eu acreditar que “o trabalho de casa” estará atempadamente feito pelo grupo de trabalho então nomeado, espero que os lideres institucionais e as forças políticas locais estejam atentas e preparadas para se necessário, pressionarem a nova ministra da Saúde para que o projecto seja uma realidade muito em breve. Pois no meu entender a sua necessidade à muito que é para “ontem”. E desta vez não puderam ser apenas promessas como aquelas a que nos foram habituando no passado.
Por: Joaquim Nércio