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A prova dos quinze

Enchidos tradicionais de Penamacor passaram pelo crivo de provadores oficiais e do público

Os enchidos artesanais de Penamacor estiveram à prova no último domingo. Público em geral e seis provadores oficiais da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) mobilizaram os sentidos para apurar as particularidades de chouriços e chouriças tradicionais com vista a identificar o tipo de enchido característico do concelho. Uma tarefa a que todos se entregaram com abnegado afinco, acompanhado de algum pão e regado com outro tanto de vinho. Coisa de não misturar sabores. Os chouriços mais pontuados, numa escala de adoro a detesto, vão agora passar à fase dos testes laboratoriais que determinarão os aspectos físico-químicos.

A sessão decorreu animada e ao som de música tradicional na Casa do Povo de Penamacor, onde algumas dezenas de populares não quiseram deixar de contribuir com o seu veredicto. O assunto é sério e a própria autarquia pondera avançar para a certificação de denominação de origem numa fase posterior e até para a realização de uma feira de enchidos. «Desde que haja produto de qualidade e em quantidade», avisa Domingos Torrão, para quem é importante tirar partido deste tipo de produtos tradicionais, à semelhança do que acontece com o mel, o azeite e o queijo. «É fundamental identificar estes elementos de forma tecnicamente abalizada para motivar potenciais investidores no fabrico e comercialização de um produto genuíno de Penamacor», refere o presidente do município, que considera ter chegado o momento de «recuperar algo que estava perdido em termos de comercialização». A identificação desta mais-valia contou com a colaboração de 36 produtores – três por freguesia -, cujas amostras numeradas passaram pelo paladar apurado dos provadores da UTAD e a degustação mais ou menos conhecedora do público. De resto, não faltaram chouriços, chouriças, morcelas e farinheiras vindas das 12 freguesias do município, já que a organização disponibilizou 70 quilos de enchido para o lanche-convívio e mais de uma dezena para a prova oficial.

Conceição Martins, professora da UTAD, foi a primeira a terminar o exame organoléctico de 15 amostras diferentes. Sem revelar o seu veredicto, a especialista confessou ter «adorado» particularmente um exemplar. «Houve ali um com uma cura interessante», adiantou, explicando que os provadores têm que ter em conta o cheiro, o aspecto e o gosto para decidir. «Para ser bom, o enchido tem que ser agradável ao paladar, que depende da qualidade da matéria-prima – o porco -, a forma como é confeccionado e curado. Tudo isso se conjuga para o gosto do enchido», acrescenta quem tem vindo a participar em eventos do género, como a Feira do Fumeiro de Vinhais e noutras localidades transmontanas. A professora não tem dúvidas que o exemplo de Vinhais pode repetir-se por terras beirãs, onde o porco alentejano deve ser reintroduzido e preservado. «Será uma mais valia para o concelho. Não vamos descobrir nada, é só fazer aquilo que já se fez e que foi tradição antiga da região», recorda Conceição Martins. E com produtos de qualidade virá a actividade económica e «algum» desenvolvimento, tal como aconteceu em Vinhais. «A feira, iniciada em 1983, começou por ser uma realização incipiente, mas actualmente já é uma actividade económica de algumas pessoas. Há procura, consegue-se fazer o produto com qualidade e mantendo as suas características, o que gera uma espécie de desenvolvimento nestes locais», recorda. Entretanto, a UTAD está actualmente a participar num projecto internacional com enchidos tradicionais artesanais de Portugal, Itália, França e Espanha para detectar quais os perigos biológicos que estes produtos podem originar e propor as medidas necessárias para os evitar sem alterar as suas características próprias.

Luis Martins

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