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A Ponte Grande do Côa

Nos Cantos do Património

A maioria das pontes construídas pelos romanos suportou, ao longo dos séculos, modificações significativas que alteraram profundamente o seu aspecto original. Sofreram com a fúria das águas, com as operações militares que determinavam, por vezes, a sua destruição por razões estratégicas mas também com o desmazelo de quem devia zelar pela conservação das vias de comunicação. A falta de trabalhos de conservação e a consequente degradação foram, também, motivados pela escassa utilização dos caminhos servidos pelas pontes. Por essas razões poucas pontes construídas pelos romanos chegaram em boas condições aos nossos dias. As poucas que se conservaram necessitaram de obras de reparação ao longo dos tempos que, por vezes, implicavam a sua reconstrução desde os alicerces. Por isso, é hoje muito difícil reconhecer uma ponte construída pelos súbditos dos imperadores de Roma. E não era para menos. Ao longo de séculos, as pontes romanas foram as únicas estruturas estáveis que permitiam a passagem nos rios com mais caudal. Por elas passaram numerosos exércitos, peregrinos e comerciantes.

A ponte Grande do Côa, classificada em várias publicações como uma ponte romana, não apresenta sinais ou marcas típicas das pontes construídas pelos romanos (vide texto desta mesma coluna de O Interior na edição de 07 de Agosto de 2003). Embora se possa admitir uma origem romana, a construção que hoje é visível sobre o rio Côa não é desse período. Trata-se de uma ponte moderna com arcos também de volta perfeita (e que por isso se podem confundir com arcos romanos ou com arcos românicos medievais) construída no século XVI ou XVII e com obras profundas de reconstrução no século XIX. Neste mesmo século foi colocado um padrão comemorativo da realização de obras em 1824. Reinava então D. João VI, como refere o mesmo padrão cuja inscrição reproduzimos (de acordo com o texto do site do IPPAR):

AUGUSTISSIMI JOANNIS/ VI MAGNANIMI/ ACLONGE CLEMENTI/SSIMI ET HUMANI/SSIMI LUSITANIAE / BRASILIAE / ALGARBIORUM/QUE REGIS/ PRAECEPTO. DIE/ MAII XXVI. ANN./ 1824 EDITO, PU/BLICAM AD UTI/LITATEM HUJUS/ OPERIS RENOVA/ MEN INCAEPTUM/ FUIT, TANDEM/ ATQUE CONFE/CTUM ANN. 1825.//

Ainda na mesma estrada existe uma outra bela ponte de granito de tabuleiro plano sobre a ribeira de Gaiteiros, nas proximidades da povoação de Valverde. O caminho que dá acesso à ponte a partir de Valverde, de terra batida, é ainda cruzada por algumas viaturas ligeiras e tractores agrícolas. Esperemos que as entidades locais resistam ao impulso “modernista” de meter alcatrão em todo o percurso histórico. O troço de terra batida, desde que regularmente arranjado, pode servir os interesses quer dos possíveis visitantes quer dos agricultores. Quem estiver interessado em visitar estas duas pontes históricas pode complementar o passeio com a visita às inúmeras sepulturas escavadas na rocha de Valverde e à gruta conhecida como a Lapa Escura.

Por: Manuel Sabino Perestrelo

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