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A política está onde está o homem

Todo o poder nasce do povo e em seu nome deverá ser exercido. Este é um dos principais preceitos constitucionais do nosso país, alicerce fundamental do espírito democrático. E a política, essa coisa que muitos dizem ser apenas para os outros, deve ser discutida, pensada e reflectida, permitindo a todos, cidadãos e políticos, de forma construtiva e participativa, poder desenvolver um pensamento contestatário em relação às formas de fazer política, em defesa consciente da sua nobre importância para o bem-estar colectivo. Assim é necessário debater a política, pois falar em política envolve também os partidos, mas não se esgota neles.

Política é toda e qualquer acção em sociedade, portanto ela é toda e qualquer acção em família, em instituições colectivas, num grupo de amigos, no mundo das relações laborais. A política está onde está o homem. Está nas fábricas, nos escritórios, nas colectividades, á mesa do café, nas nossas casas e na rua. Está em todo o nosso quotidiano e é pela sua prática que a cidadania se reinventa.

É necessário restaurar as instituições, vencer empecilhos, melhorar a economia e reconquistar a confiança. E só o cidadão apto para discernir em consciência das suas competências junto á sociedade se irá comprometer com as causas e os fins comuns. Somente através da cidadania uma sociedade consegue derrubar os muros do cepticismo, da desmotivação, da indiferença e reedificar o ânimo, a esperança e o entusiasmo tão necessários em qualquer projecto de sociedade desenvolvida, justa, solidária livre e feliz.

A cidadania ou o direito do cidadão, implica a participação de todos na governação. Se não fosse assim, como seria possível, por exemplo, os políticos serem representantes eleitos do povo, se a esse mesmo povo, a quem não se pode obrigar a filiar em partidos, não se reconhecer o direito de opinar, questionar, criticar ou elogiar esses mesmos políticos partidários ou governantes? A quem cabe a verdadeira tarefa de fiscalizar o desempenho dos eleitos, a não ser aos próprios eleitores, que no compromisso do dever cívico são chamados a votar? Qual é o político partidário que antes de o ser não é um cidadão? Claro que todas estas questões fazem para todos nós, muito sentido e as respostas são óbvias. Mas a diferença é que muitos, enquanto cidadãos, nunca fizeram política na lógica da cidadania e quando aderem aos partidos políticos, não conseguem fazer valer as suas causas e dizer aos respectivos partidos, que os seus compromissos para com as pessoas, para com a sua terra e para com a sociedade, estarão sempre acima dos compromissos para com os seus partidos!

Para ajudar a construir uma sociedade justa e livre, o acto de participar politicamente é uma necessidade. Pois, não basta dizer que todos são livres e iguais como fazem a maioria das constituições existentes, se não nos dispusermos a assegurar condições políticas e possibilidades económicas para que as pessoas possam efectivamente gozar de liberdade e igualdade. Não se trata de mera concessão de direitos, é necessário efectivá-los de facto, mantê-los ou aperfeiçoá-los. As questões sociais e políticas não podem ser tratadas como se fossem problemas técnicos e resolvidas por burocratas. Todas as questões sociais e políticas pertencem á sociedade e a ela compete decidir e resolver, e para resolvê-las é necessária uma consciência crítica e participativa. Pois já Platão nos dizia que “O castigo dos bons que não fazem política é serem governados pelos maus”.

Mas, como dirão muitos ou quase todos, ser político sério e transparente pouco compensa, mas nem por isso se deve desistir. Na política e na vida pública, tal como nas relações interpessoais, a transparência, a frontalidade, a verdade, a coerência e a seriedade, enfim aquilo a que eu chamo de verticalidade, deverá estar sempre presente. Pois é a única forma de assegurar a credibilidade e a confiança dos cidadãos e promover a participação de todos para projectos comuns. Mas a tendência vigente á as pessoas meterem todos os políticos “no mesmo saco”. O que cria sérios obstáculos e forma barreiras difíceis de derrubar, enclausurando ideais na não-verdade de se ser igual, um ciclo vicioso fechado num beco sem saída, quase impossível de romper, que compromete seriamente a tão reclamada regeneração e crédito da vida pública. Apesar de tudo, não se deve desistir, nem o povo, nem os políticos sérios, que os há.

Por: Joaquim Nércio

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