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«A notoriedade do CineEco é maior em termos internacionais do que nacionais»

Cara a Cara – Mário Jorge Branquinho

P – Começa no sábado a 21ª edição do Cine Eco. Qual é a fórmula para a longevidade do único festival português de cinema ambiental?

R – A razão principal da longevidade do CineEco é a determinação do município de Seia em manter no seu calendário cultural o festival, considerado um dos eventos “âncora” do concelho. Esta persistência resulta também do facto da Câmara apostar na cultura como fator de desenvolvimento e do ambiente também fazer parte dos seus objetivos estratégicos. A construção do CISE – Centro de Interpretação da Serra da Estrela resultou em grande medida do impulso dado pela existência do festival.

P – Quais foram as contrariedades que conseguiram ultrapassar ao longo destes anos?

R – A principal contrariedade tem a ver com constrangimentos financeiros, que tem sido ultrapassada através de parcerias e projetos comunitários para aliviar os encargos do município. Outra contrariedade tem a ver com o grau de adesão do público, já que o cinema ambiental não é uma área artística de atração de grandes públicos. Começa agora a despertar mais curiosidades e mais consciências.

P – Que dificuldades persistem ao fim de 21 anos de Cine Eco?

R – Persistem as dificuldades financeiras que nos impedem, por exemplo, de fazer grandes campanhas promocionais nos meios de comunicação nacional. Ou que não nos ajuda a ter mais realizadores presentes durante o festival.

P – Decorrer em Seia é um problema?

R – Só é um problema na medida em que decorre longe dos grandes centros urbanos, o que dificulta, por exemplo, que muita gente se desloque de longe para ver este ou aquele filme, quando há a concorrência da Internet. É também um problema quando ficamos de fora de circuitos privilegiados de contactos e de lóbis, mas procuramos colmatar. Mas realizar-se aqui em Seia, em pleno Parque Natural da Serra da Estrela, enquanto reserva biogenética importantíssima, já é uma mais-valia por ser o melhor plateau para a realização de um festival de cinema de ambiente.

P – Qual é a notoriedade do Cine Eco em termos internacionais? E nacionais?

R – A notoriedade do CineEco é maior em termos internacionais do que nacionais. Verifico isso pela grande quantidade e qualidade de filmes inscritos e pelo respeito que os realizadores nutrem pelo festival. Nos vários festivais por onde tenho passado, sempre que se fala do CineEco há muita gente que o conhece e o reputa de “festival de prestígio”, com uma imagem de marca já criada. O festival já tem sido várias vezes caso de estudo em vários fóruns internacionais e quando se fala da evolução do cinema ambiental é dado o caso do CineEco. Ainda no ano passado fui convidado para uma conferência no Rio de Janeiro para falar da evolução do cinema ambiental, a partir do nosso caso de 20 anos de percurso. Somos com frequência solicitados para fazer mostras de filmes em vários países – sobretudo no México, no Rio de Janeiro e na Amazónia, no Brasil. Outro fator que demonstra a nossa notoriedade internacional tem a ver com o facto de termos sido, juntamente com o Cinemambiente de Turim, os fundadores da Green Film Network, uma rede internacional que conta já com 29 festivais de cinema de ambiente de todo o mundo. Em termos nacionais ainda lhe falta esse reconhecimento, o que se deve em meu entender a alguma snobeira reinante nos chamados meandros editoriais de cultura. Um fator que impede que os chamados jornais de referência lhe deem o destaque merecido.

P – Quais são as novidades desta edição?

R – A maior novidade é a qualidade dos filmes em competição e nas sessões especiais. Temos em Seia o melhor da produção internacional do cinema de temática ambiental. Há uma notória melhoria de ano para ano, sobretudo na abordagem artística a várias questões que entroncam no ambiente. Desde a problemática do que comemos, dos nossos hábitos de vida, intoxicações, poluições, modelos de crescimento, constrangimentos sociais, atropelos culturais, etc. A própria indústria cinematográfica americana está a despertar para grandes produções, na perspetiva de incrementar a reflexão, denúncia e procura de soluções, através do lado lúdico e artístico do cinema. Outra das novidades é a realização de uma conferência sobre alterações climáticas porque este ano o festival destaca a encíclica do Papa sobre “Os cuidados da casa comum”, com enfâse nas alterações climáticas. A competição Lusofonia – Panorama Regional volta a contar com duas sessões de curtas feitas na região e isso é positivo e constitui mais uma marca da ligação do festival à região.

P – Há 80 filmes a concurso nas diferentes secções. Tem sido fácil ou difícil escolher as obras da seleção oficial?

R – Fazer a seleção dos filmes é sempre uma tarefa difícil mas gratificante, preenchendo-nos grande parte das semanas do Verão. Quando começámos, em 1995, o ambiente ainda não tinha a projeção que hoje tem e os filmes ainda eram muito primários e minimalistas. Grande parte deles apresentavam-se numa perspetiva moralista e quase sempre formal e pedagógica. Falar de ambiente era falar de árvores e passarinhos. Hoje, há uma imensidão de temas que se cruzam e apesar da quantidade ter aumentado significativamente, a qualidade melhorou muito também e isso facilita. Hoje, a preocupação na seleção e elaboração da programação centra-se no cuidado em procurar ir de encontro aos vários públicos, numa abrangência de estilos, abordagens temáticas e conceitos artísticos. Procuramos evitar a ideia de que os filmes de ambiente são uma “eco-seca”, por isso redobramos o nosso empenhamento na seleção e programação.

P – Duas décadas depois, o que falta fazer no Festival Internacional de Cinema Ambiental da Serra da Estrela?

R – Falta alargar o festival aos 15 concelhos da região das Beiras e Serra da Estrela para ganhar escala e maior dimensão. O CineEco já tem uma vasta rede de extensões – Três ilhas dos Açores, Lisboa, Alcobaça, Braga, Coimbra, Abrantes, Alcanena, Leiria e Loures –, mas como festival da Serra da Estrela pode alargar a sua dimensão efetiva ao território, envolvendo os seus agentes locais, sobretudo escolas. Do ponto de vista ambiental, o CineEco cumpre um serviço público, enquanto marca de intervenção cultural e de educação ambiental, mas pode e deve alargar a sua base de incidência. Com isso, pode partilhar custos e simultaneamente abranger mais públicos dos vários municípios da região.

Perfil:

Diretor do Cine Eco

Naturalidade: Sabugueiro, Seia

Idade: 49 anos

Profissão: técnico superior do município de Seia

Currículo: licenciado em Ciências Sociais, metrado em Animação Artística, responsável da Casa Municipal da Cultura de Seia (programador); presidente da Associação de Beneficência do Sabugueiro (IPSS); presidente da Assembleia da Comunidade Intermunicipal das Beiras e Serra da Estrela; autor dos livros “Sentido Figurado”, (1996); “O Mundo dos Apartes”, (2002) e “Estranhos Dias à Janela, (2015).

Livro preferido: “O Estrangeiro”, de Albert Camus

Filme preferido: “O dia depois de amanhã”, de Roland Emmerich; “A Verdade Inconveniente”, de Al Gore, e “Geração Fast Food”, de Richard Linklater

Hobbies: Cinema, escrita criativa, caminhadas e fotografia.

Mário Jorge Branquinho

Sobre o autor

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