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A moderadora

Crónica Política

A deputada Maria Elisa, depois de ver frustada a sua expectativa de merecido descanso no sossego da televisão pública (aquela que tão cara fica ao erário público por força do elevado número de trabalhadores – Sarmento dixit), com suspensão do seu mandato parlamentar, optou, enfim, por renunciar à árdua tarefa de representar os eleitores albicastrenses na Assembleia da República alegando, na sua desilusão parlamentar, “ter dificuldades em encontrar um espaço de intervenção onde se reconhecesse e sentisse útil” – palavras da própria.

A senhora ex-deputada (que depois de tão eficaz e notoriamente ter exercido a representação dos eleitores de um distrito se viu forçada à representação de todo um povo na embaixada de Londres) andou certamente distraída nessa sua insana busca por um espaço de intervenção.

Bastaria ter olhado com mais atenção para as suas colegas na bancada laranja e colher o exemplo da deputada do outro distrito beirão que, mesmo sem possuir um curriculum com as credenciais jornalísticas e televisivas que a Maria Elisa ostenta, tem sabido construir um efectivo espaço próprio, de visibilidade e intervenção.

A sra. deputada Ana Manso não se quedou, na sua actividade parlamentar, por passeios embasbacados pelos corredores dourados dos passos perdidos ou por sentar a indolência representativa nos suaves estofos parlamentares. Não, a sra. deputada optou por passear pelos quatro cantos do distrito que representa e não se importa de substituir a poltrona de São Bento por uma qualquer rija cadeira na moderação de um debate.

Há festa na vila, vão deitar foguetes na aldeia… a sra. deputada está lá. Há inauguração do chafariz… a sra. deputada bebe o primeiro copo. Um governante distraído entra no Governo Civil… já lá está a sra. deputada.

Rodopiando por todos os eventos distritais, qual figura de jet-set de festa em festa, a sra. deputada apenas lamenta não possuir o dom da ubiquidade, que lhe permitisse assistir na totalidade às reuniões da vereação sem perder nenhuma das suas múltiplas actividades.

E quando, por razões que só a ingratidão do céu conhecerá, alguma semana decorre sem que a sra. deputada tenha tido pelo menos cinco minutos de palanque, os diligentes acólitos, que ela magnanimamente colocou nas cadeiras dos serviços públicos, tratarão de inventar um qualquer debate em que a sra. deputada possa, com pompa e circunstância, moderar, na sua qualidade de insubstituível moderadora oficial de debates do PSD guardense.

O tema do debate pouco interessa, já que a sra. deputada modera qualquer coisa. A corte apenas tem de inventar um assunto, de preferência enquadrável nas actividades de um dos serviços públicos, e reservar a cadeira do meio na mesa de honra. A moderação estará sempre assegurada. Trata-se de incêndios… a sra. deputada modera; debate-se a educação… a sra. deputada modera; discute-se a saúde, a pobreza, o emprego… a sra. deputada lá está para moderar.

Depois, os aplicados ajudantes da sra. moderadora terão de garantir uma plateia que dignifique e assista às intervenções dos debatentes e efusivamente aplauda a moderação, já que, ocupar um coreto sem auditório seria desprestigiante para a figura central da cerimónia. É tarefa fácil para os reconhecidos auxiliares. Se os agregados partidários não estão disponíveis, ou o local é demasiado vasto, é só arregimentar os funcionários do respectivo serviço público, dispensá-los das suas tarefas ao serviço do estado e mandá-los desempenhar a muito mais importante ocupação de aplaudir a sra. moderadora.

Assim, de debate em debate, de moderação em moderação, a sra. deputada egitaniense vai construindo um muito seu “espaço de intervenção” que certamente a levará, dado o êxito das iniciativas já realizadas e o fulgor das moderações, a almejar a criação do lugar, por decreto governamental, de moderadora nacional. Alto lugar em que, no decurso de cerimónia por si moderada, será barrosamente investida.

E aqui tem, sra. ex-deputada Maria Elisa, como, seguindo o exemplo da sua colega e vizinha, se poderia ter poupado à angústia que certamente lhe causa, qual emigrante de mala Louis Vuitton a tiracolo, ter de abandonar o seu país em busca do ambicionado espaço próprio em londrinas paragens.

Por: Rita Cunha Mendes

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