Numa análise feita aos filmes estreados até ao momento, com metade do ano ultrapassada, a sensação que fica até agora de 2005 é de falta de sal. Filmes razoáveis lá vão surgindo quase todas as semanas, mas faltam aqueles que apetece realmente partilhar e guardar para sempre. Tardam em surgir os filmes que iremos ver repetidamente até à exaustão, até termos vergonha de admitir que o já vimos tantas e tantas vezes: «És maluquinho, ou quê?».
Em ano tão fraco a memória leva-nos de imediato para os poucos que se destacaram. E aqui os sul-americanos marcam forte presença com La Niña Santa, Maria Cheia de Graça e Temporada de Patos. Propostas suficientemente saborosas para desenfastiar do cinema todo igual que cada vez mais nos invade as salas.
Mas até o cinema americano se vai conseguindo salvar no meio de tanta pasmaceira e falta de génio. Como sempre o foi conseguindo fazer, para sermos justos. Se Million Dollar Baby surge como vencedor antecipado do ano, num regresso a um classicismo de que já, por vezes, se sente saudades quando aquilo que vemos, cada vez mais, parece colocado em filme sem se saber muito bem os motivos para tal, como se fazer cinema fosse apenas e só uma colagem de ideias superficiais soltas, mesmo que bonitas, que no fim podem resultar num engraçado objecto de potencial interesse quando projectado nas salas escuras de cinema (antes mágicas e de onde essa magia já há muito fugiu), outros americanos já deixaram a sua marca de distinção. Closer, Birth, Life Aquatic with Steve Zissou, O Assassínio de Richard Nixon e o recente Crash – Colisão, são alguns dos poucos que merecem um olhar mais atento.
Do cinema europeu, este ano, até agora, só nos ficou Vera Drake, de Mike Leigh. Está bem que o ano não tem sido lá muito positivo na quantidade de filmes europeus estreados nas nossas salas, mas perante aquilo que nos chegou, tal até se percebe. Desinteressantes e desinspirados, perdidos em busca de algo que urge ser encontrado, o cinema europeu encontra-se numa deriva perigosíssima de onde se espera que saia rapidamente. Até lá, nada a assinalar. E Portugal, pelo menos por enquanto, ainda faz da Europa, e o seu cinema, em contraste com o ano passado, onde vários bons filmes se estrearam ainda pouco ou nada de interessante deu a conhecer. A excepção é Antes que o Tempo Mude, de Luís Fonseca, mas para alguns tal filme já não é bem deste ano.
Do resto do mundo também o vazio. O cinema americano domina e pouco espaço deixa para os restantes. A conversa é antiga, o problema, esse, é cada vez maior. Referências ainda assim a Adeus, Dragon Inn, de Taiwan e Sommersault – Salto Mortal, da Austrália.
E de bom 2005 nada mais trouxe até ao momento e são poucas as perspectivas, olhando para as próximas estreias previstas, de que tal cenário mude. Soderbergh (com Ocean’s Twelve) continua a sua brincadeira dos oceanos; Woody Allen (com Melinda e Melinda) melhorou mas ainda traz consigo alguma desilusão por culpa das memórias que temos; Bergman regressou com o visceral Saraband, mas onde, ainda assim, falta algo para que se possa colocar junto aos seus melhores trabalhos (talvez mais cinema e menos teatro); Scorsese continua a sofreguidão pelo espectáculo numa tentativa de ser o maior realizador da actualidade, com um Aviador que se deseja ter sido a sua last try para o Óscar (o filme não é mau, mas aborrece ver o responsável por Táxi Driver ou Touro Enraivecido, envolto em tanta pirotecnia); e afinal Sideways não se revelou a pérola que vinha anunciada pela crítica americana.
Não está a ser mau, mas desejava-se que fosse melhor. Por vezes, não ser mau não basta. 2005 Wake Up! (Spielberg estreia hoje, nunca se sabe se não será o inicio de um resto de ano mais animado).
Por: Hugo Sousa