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«A marca deste mandato, com tanta festa e eventos, é que uma pessoa por dia abandonou a Guarda»

Entrevista a Eduardo Brito, candidato do PS à câmara Municipal da Guarda

P – Como está a candidatura do PS à Câmara da Guarda?

R – A candidatura está ótima, está a mobilizar pessoas e a fazer o seu trabalho. Tem um programa excelente, fruto da colaboração de mais de 50 pessoas, num sinal de que é preciso envolver a cidade na definição dos seus grandes objetivos. Conheço bem a cidade e os seus problemas, particularmente aqueles que são estruturais e muito complicados de resolver.

P – O que o fez regressar à política?

R – O desafio importante para o futuro de uma cidade capital de distrito como a Guarda, que está a apostar tudo no betão em detrimento da inovação.

P – Qual é o “prémio” ou compensação que espera receber por ser candidato na Guarda (por fazer um favor ao partido)?

R – A política para mim é serviço público, não é carreira pessoal. O prémio que espero são os votos dos guardenses e nenhum outro. Vou dedicar quatro anos à Guarda como presidente da Câmara ou vereador e gostava que todos os candidatos dissessem isso com clareza. Vou ser um presidente de Câmara a tempo inteiro porque os políticos devem exercer os seus cargos em regime de exclusividade, sem trabalharem para empresas. Isto não é uma acusação, é uma constatação. Em Seia, dediquei-me exclusivamente à Câmara e os meus rendimentos eram apenas os que provinham do vencimento enquanto autarca. Posso garantir isso aos guardenses, outros candidatos já não.

P – Quais são as grandes carências que existem neste momento no concelho?

R – A Guarda comete um erro nestes quatro anos ao apostar toda a sua estratégia em ajardinamentos e rotundas e nos eventos/festas.

P – Então acha errado haver uma política de eventos, de promoção da cidade?

R – Moderadamente. A cidade tem que ter festa, mas dizer que a Guarda está em alta porque houve uma noite branca ou um “sunset” é um erro. Além do mais, há uma enorme incapacidade de inovar, pois tudo o que está a ser feito já aconteceu noutras cidades. Veio uma equipa de jardineiros e outra de eventos, com excelente comunicação, mas depois não há nenhuns resultados económicos. Temos que concluir que as pessoas vêm aos eventos à Guarda e vão dormir à Covilhã e a Castelo Branco porque a diferença de dormidas entre a Covilhã e a Guarda é da ordem das 150 mil. Em 2015, a diferença das receitas em turismo entre a Covilhã e a Guarda é da ordem dos 5 milhões de euros. Algo está mal. Querer ignorar isto é como o doente ignorar o que dizem as análises.

P – A propósito do turismo, uma das ideias que defende é retomar a ligação direta da Guarda à Serra da Estrela através da famosa “estrada verde”. Até que ponto a cidade ficou para trás na atração de visitantes num período em que o país cresceu imenso em termos turísticos?

R – Não é só em termos turísticos, também acontece na criação de empresas. A nível nacional é da ordem dos 34 por cento e na Guarda fica-se pelos 5 por cento, já as insolvências são cerca de 98 por cá quando no país situa-se nos 34. No turismo, a questão não se resolve apenas com a ligação ao maciço central, que tem que ser feita porque a Guarda perdeu o contacto com a Serra da Estrela, que é uma das maiores marcas do país e da qual a Covilhã beneficia.

P – Como avalia a gestão de Álvaro Amaro?

R – Eventos, uma ou outra pequena requalificação e mais nada. Pode-se dizer que melhorou o equilíbrio das contas, mas há muita coisa que tem que ser devidamente analisada quando chegarmos à Câmara.

P – Mas reconhece que, além dos eventos, também houve requalificações que eram necessárias?

R – Sim, também houve aspetos positivos. Nenhum autarca faz tudo mal, mas o que importa é ir ao substancial. O nosso programa eleitoral é inovação, o do PSD é o mesmo, betão. A Guarda precisa de olhar para dentro e ver as potencialidades que não está a utilizar bem. Como é possível o IPG ter hoje 2.636 alunos e que em Bragança, uma cidade igual à Guarda, o Politécnico tenha 6.000 estudantes e desses 1.800 são estrangeiros? A autarquia tem que fazer uma parceria estratégica com o Instituto, que é um dos pilares fundamentais do desenvolvimento regional. Queremos apoiar o IPG com 400 mil euros para a internacionalização, para a captação de alunos e para a sua instalação na Guarda, nomeadamente no centro histórico.

P – O que querem fazer no centro histórico?

R – Queremos reabilitá-lo incentivando os privados, dando-lhes condições para investir. O centro histórico tem que ser um espaço de cultura, de inovação, de comércio e de conhecimento. Queremos ali criar uma incubadora de pequenas empresas e instalar dois museus porque o centro tem que fervilhar de pessoas, negócios e ideias. Numa cidade como a Guarda isso é absolutamente decisivo. Colocar uns bancos e umas lâmpadas é mais do mesmo.

P – Há 30 anos que se fala em intervir no centro histórico e não se fez nada. Que garantias dá aos eleitores de que vai fazer alguma coisa se for eleito?

R – É necessário investimento público e levar para lá a economia, foi assim nos centros históricos por esse mundo fora. Queremos que o Governo construa um novo quartel da GNR e que a direção de Finanças saia dali para se aproveitarem aqueles 17 mil metros quadrados para um equipamento científico de dimensão europeia, a “Casa do Clima”. Vai levar tempo, mas tem que ser uma referência na investigação, formação, conhecimento e na área lúdica para atrair pessoas e despertar depois o investimento privado.

P – Quer fazer da Guarda uma “cidade inteligente”. Parece um chavão eleitoral, como vai conseguir esse objetivo?

R – A criação de uma incubadora no centro histórico é absolutamente fundamental. Queremos assumir a liderança nas novas tecnologias, nomeadamente no “blockchain” – que é um passo à frente na internet – e no seu desenvolvimento, mas também fixar jovens talentos. A aposta na inovação é o nosso grande objetivo, mas acrescido de cultura com dois museus da alimentação e dos jogos tradicionais que iremos fazer com a recuperação de imóveis. Cultura, inovação, negócios, pessoas, pequeno comércio e é aí que entra a tão falada moeda “Sancho”…

P – É uma proposta que parece não estar a correr muito bem. O que se pretende afinal?

R – Há um caminho a percorrer e um candidato como eu, que tem a tranquilidade e a liberdade do que está a fazer, não se importa de correr esses riscos a favor da Guarda. Estamos a abrir novos caminhos, novas portas, coisa que o PSD não faz. Álvaro Amaro é um político de ciclos curtos e, quando se acaba o filão da festa, normalmente muda de lugar. E ele não tem outro filão. A marca indelével deste mandato, com tanta festa e eventos, é que uma pessoa por dia abandonou a Guarda. A Guarda tem o IMI mais alto do país, tem a água das mais caras, como é que uma cidade destas é atrativa até para os que vivem cá e já têm custos energéticos elevadíssimos? Se há dinheiro para eventos e festas, muitas delas pagas a empresas que não são de cá, sem resultados económicos, então baixe-se a carga fiscal. Mas não há uma palavra sobre isso no programa eleitoral do PSD porque o IMI dá oito milhões por ano e com esse dinheiro faz-se muita festa. Nós propomos que desse dinheiro se aloque um milhão para o empreendedorismo através de um fundo municipal que vamos criar para apoiar os bons projetos e os talentos que se criam na Guarda ficarem, mas também para atrair empresas e ajudar as empresas que já cá estão porque precisamos muito delas para reter talentos e inovação. A Guarda está entre dois eixos rodoviários excecionais, a A23 e A25, vai ter graças ao PS a Linha da Beira Alta renovada e a Linha da Beira Baixa, bem como um terminal ferroviário. Tem, por isso, todas as condições para se desenvolver. O que falta é valorizarmos melhor os nossos recursos e também que a autarquia se envolva na criação de emprego. Quando começámos esta campanha o emprego não fazia parte dos temas, hoje, graças ao PS, todas as candidaturas dão importância ao emprego – e bem. A moeda pensada – está a ter sucesso em Barcelona e Bristol – é para proteger o comércio local e na prática já existe. O que são os pontos da TAP? Ou os pontos do Continente? É moeda…

P – Mas entretanto o “Sancho” contribuiu para alguma diversão dos seus adversários?

R – É sinal que estão a ler o nosso programa. Ouve falar no do PSD? Não. Estamos a conseguir o objetivo que queríamos porque o problema maior começa no dia 1. Uma das pessoas que desvalorizou o “Sancho” foi esse grande comunicador Marques Mendes, que, há uns anos, foi a Gouveia anunciar um parque tecnológico. Hoje, não há lá nada a não ser ovelhas a pastar. Portanto, não tem credibilidade nenhuma, foi um favor a um amigo. A moeda é para os guardenses. A Guarda tem que descobrir outra alternativa a este modelo de governação, que está esgotadíssimo – não tenho dúvidas que o próprio Álvaro Amaro reconhece disso.

P – Mas vê aspetos positivos neste mandato? Quais?

R – Concerteza que há aspetos positivos na cidade, o que digo é que não é por aqui que a Guarda atinge a liderança e a importância económica que precisa ter. Veja-se o caso do mundo rural. A Feira Farta é uma boa iniciativa em termos de evento, mas não resolve nenhum problema. Aí está a incapacidade do PSD ir à profundidade dos problemas, pois o que temos que fazer é pôr alguns produtores a produzir. Eu vou lançar uma área inovadora, que é fazer do setor social, que tem 1.600 trabalhadores, o grande aliado do mundo rural para voltar a dar alguma vida económica aos nossos agricultores, que depois podem vir à Feira Farta vender os seus produtos biológicos. Nesta área queremos também na Guarda um Centro Nacional de Investigação na Agricultura Biológica porque queremos estar na linha da frente. Não devemos ter medo de abrir caminho, estamos fartos de políticos que não arriscam. Dizer mais do mesmo, fazer uma rotunda, uma estrada, uma avenida, é simples, é arranjar dinheiro nos fundos comunitários. Agora reter talento, inovação e arriscar novos caminhos, algo que nos faça sacudir a pressão que estamos a ter por parte dos nossos vizinhos, que nos absorvem no domínio económico, isso é mais difícil.

P – Em 2013 o PS perdeu a Câmara da Guarda de forma estrondosa. Acha que quando Álvaro Amaro pede uma derrota pesada para o PS ainda é para castigar os quatro anos anteriores ou é para fazer esquecer o atual mandato do PSD?

R – O PS está hoje muito bem e recomenda-se. Quando Álvaro Amaro diz isso penso que o faz mais para tapar essa ilusão em que vive e o fracasso que é a sua governação naquilo que é estrutural e económico. Veja que tudo o que é estrutural na Guarda tem a marca do PS. Os socialistas cometeram erros e já pagaram por isso, pelo que ninguém pode ser julgado duas vezes. O que está em apreço neste momento é o mandato de Álvaro Amaro, é a avaliação do seu programa e da sua ação no rio Noéme, no rio Diz, na Quinta da Maúnça, nas medidas para os jovens, em tudo o que não foi feito. Podia fazer uma lista enorme do que não fez e devia ter feito. Mas à falta de um argumento válido, Álvaro Amaro fala em castigar o PS, que não é poder atualmente. Isso é até um insulto porque o que é estruturante, as grandes obras, na Guarda tem a marca do PS. O PSD abandonou o Parque Urbano do Rio Diz, a Quinta da Maúnça, onde há 74 hectares para a educação ambiental. Não há mobilidade na cidade, nem uma rede de transportes municipais, tudo isso dá trabalho. O PSD faz aquele trabalho simples, cria uma ilusão de que a economia está a mexer com as festas e lança essas parangonas de que os socialistas isto e aquilo… A Pousada da Juventude vai abrir em breve, com a envolvência da Câmara e muito bem…

P – Há quatro anos, a única promessa que Álvaro Amaro assumiu categoricamente foi reabrir o Hotel Turismo. Entretanto continua encerrado. Como é que a sua candidatura vai resolver a situação?

R – Eu não tenho que resolver, eu tenho que exigir ao Governo um hotel requalificado e com uma componente para estágios de fim de curso. O hotel não pode concorrer com o IPG, onde queremos voltar a ter 7.000 alunos, como já teve. É isso que exigimos, não há meios-termos. O mesmo em relação à abolição das portagens, que defendo desde que era presidente da Câmara de Seia. Seremos os primeiros combatentes contra as portagens porque só podemos dar competitividade às empresas eliminando custos de contexto. Entre a Guarda e o partido, eu caio sempre para o lado da Guarda porque não tenho carreira política, nem arrisco nada.

P – Acredita que é mesmo possível haver autoestradas sem portagens?

R – Acredito que “água mole em pedra dura tanto bate até que fura”. Acredito muito que é possível e sou capaz de convencer o primeiro-ministro que isto é um erro e que as portagens trazem mais custos do que benefícios para o Estado.

P – A duas semanas das eleições, qual é a radiografia que faz da sua candidatura à Câmara da Guarda?

R – Estou a viver um dos momentos mais altos da minha curta vida política – trabalhei 20 anos numa empresa têxtil e entrei mais tarde na política, atividade que intervalei sempre com trabalho – porque é uma Câmara maior do que aquela que governei, em Seia, com mais ambições e desafios muito maiores. A escolha foi titubeante ao princípio, mas hoje é um privilégio poder andar nas ruas da Guarda a defender um projeto em que acredito. Além disso, esta é uma candidatura que junta pessoas, aqui não há superdotados. Para mim, liderar é convencer e não mandar. Há uma diferença muito grande entre o chefe e o líder: o primeiro impõe, o segundo obtém consensos.

P – Acha que é possível o PS ganhar a Câmara da Guarda no dia 1 de outubro?

R – Acho, tudo é possível na política. Mas temos que convencer todos os guardenses que temos um bom projeto político – que a Guarda está a discutir. Era o que queríamos, pôr a Guarda a falar dos seus problemas porque houve uma estratégia de ilusão e de ignorar os seus problemas estruturais. Essa vitória está adquirida porque havia quem pensasse que isto ia ser um passeio triunfal, que só discutiríamos a dívida. Não, só se muda o futuro, o passado não. E sobre o passado o povo já fez doutrina, agora são estes quatro anos que têm que ser escrutinados.

P – Portanto não acha que tem que ser julgado pelo histórico do PS na Guarda?

R – O PS tem que ser avaliado, mas o seu ativo na cidade é notável comparado com o do PSD. Veja-se o investimento na ferrovia e se, como desejo, for lançada a segunda fase do hospital… Mas queremos mais, e por isso já estamos a defender a instalação da escola nacional de formação dos militares do SEPNA da GNR. Comigo não há derrotas antecipadas, nem nada é impossível, por isso os resultados também não o são, mas será a Guarda a falar.

P – Atualmente acha que há medo e conformismo na sociedade guardense? Já sentiu isso?

R – Ficaría-me na elegância pelo seguinte. Adoro um clima mais livre, estou habituado há muito tempo a não condicionar com as políticas da Câmara as liberdades dos cidadãos. Eu não vejo em cada pessoa que discorda do presidente da Câmara um adversário ou um inimigo porque o contraditório faz avançar as sociedades. O presidente da Câmara não pode impor, tem que convencer, esse é o meu estilo.

Uma das pessoas que desvalorizou o “Sancho” foi esse grande comunicador Marques Mendes, que, há uns anos, foi a Gouveia anunciar um parque tecnológico. Hoje, não há lá nada a não ser ovelhas a pastar. Portanto, não tem credibilidade nenhuma, foi um f A Guarda tem o IMI mais alto do país, tem a água das mais caras, como é que uma cidade destas é atrativa até para os que vivem cá e já têm custos energéticos elevadíssimos?

Comentários dos nossos leitores
Mike mikealfa@hotmail.com
Comentário:
Grande entrevista, clara, precisa e concisa, conhece os problemas da Guarda e tem soluções para os resolver. Votei AA mas reconheço que foi um erro, Voto Brito. Parabéns pela clareza.
 
joaopaulo joaopaulo1988@hotmail.com
Comentário:
Está a mobilizar pessoas, onde? Umas pessoas não se pode considerar mobilização? Conhece bem a Guarda, de onde? Enfim. A derrota vai ser estrondosa
 

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