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«“A Guarda” lutará sempre para defender o Homem na sua integridade»

Cara a Cara – Entrevista

P – Na comemoração dos 100 anos de existência, quais os novos desafios que se colocam ao semanário mais antigo do país?

R – É normal que o desafio seja o próprio tempo, a história dos homens do nosso tempo, a desencadeá-lo. O jornal quer servir o Homem e como tal lutará sempre para que seja defendido na sua integridade física, psíquica, moral e também nas circunstâncias próprias do seu viver, desde a economia até à cultura e por aí fora. Por conseguinte, este é um desafio diário pela própria vida humana que sucede aqui ou além porque, verdadeiramente, os problemas surgem a cada hora e a cada momento e nós vamos procurar responder-lhes precisamente quando os detectamos.

P – Ao longo deste tempo todo, que importância e relevo teve “A Guarda” no desenvolvimento da sociedade desta região?

R – Não sou capaz de responder cabalmente a essa pergunta, mas, quando era garoto, liam-se poucas coisas na minha aldeia e quando vinham os jornais as pessoas acabavam por ler de fio a pavio “O Amigo da Verdade” e “A Guarda”. Por conseguinte, só no aspecto cultural da própria leitura de gente bastante pobre e que vivia apenas da subsistência da agricultura e não tinha muitos livros, já era muito importante porque o jornal lhes abria o horizonte para olharem uma ou outra ponte daquilo que se falava. Também é normal que as pessoas católicas da diocese confiassem mais nos escritos da Igreja do que nos de outras ideologias nas quais não acreditavam.

P – Durante estes 100 anos, quais os episódios que considera que mereceram mais destaque no semanário?

R – Suponho que foram os episódios da Igreja. Tudo aquilo que faz parte da própria história da Igreja, desde a ordenação dos Bispos na Catedral, às obras dentro da Sé, porque ela continua a ser o “ex-libris” desta cidade. Também os próprios eventos que decorreram aqui, como a vinda da Rainha D. Amélia em 1907, e noutros factos o jornal esteve sempre atento.

P – E a nível de nomes conceituados que tenham colaborado com o jornal. Quer destacar alguns?

R – Temos muitos nomes… Concerteza que não me vou lembrar de todos, mas temos o doutor Artur Bívar, o arcebispo de Évora, Manuel da Conceição Santos, mas que foi professor do Seminário da Guarda e vice-reitor. Temos ainda outros nomes bastante conhecidos como os Dias da Fonseca.

P – Nos dias de hoje, faz sentido continuar a existir um jornal católico?

R – “A Guarda” é uma referência para muita gente, porque na Igreja prega-se a palavra de Deus, logo directamente agarrada das páginas santas dos Evangelhos ou de outros livros bíblicos que vamos proclamando. Mas “A Guarda” lê os acontecimentos e interpreta-os segundo a visão cristã. O que o jornal faz é olhar os acontecimentos do homem, reparar neles, meditá-los e mesmo criticá-los na verdadeira acepção da palavra. É evidente que ainda hoje isso faz sentido e é muito preciso, na medida em que há coisas que nos parecem muito estranhas neste mundo.

P – Há espaço para “A Guarda” crescer ou os seus responsáveis temem que possa haver uma redução do número de leitores com o passar dos anos?

R – O crescer ou não crescer não é um grande problema, porque nós na Igreja, tanto celebramos missa para 400 pessoas, como para 40. Em termos do próprio jornal, é evidente que tem o suporte da Igreja e dos próprios cristãos e estou a falar na via económica das coisas. Mas também é normal que, com tanta publicação que existe actualmente, as pessoas possam escolher melhor aquilo que lhes convém. É preciso, julgo eu, uma certa conquista de novos públicos porque alguns cristãos nem sequer sabem que há um jornal católico e era bom que soubessem e que, de alguma forma, se dedicassem também a isso.

P – Que comentário lhe merecem as declarações do secretário de Estado Feliciano Barreiras Duarte que afirmou à revista da Associação Portuguesa de Imprensa que os jornais regionais usam um modelo “amador e proteccionista” em que a “maioria sobrevive à conta do Estado”?

R – Também é evidente que o Estado vive à nossa conta, porque não fabrica dinheiro. O Estado recebe o dinheiro dos impostos das nossas gentes e por conseguinte essa atitude pode ser contraposta com outra igualíssima. Outro aspecto é que o Estado tem que olhar para o bem comum das pessoas e se os jornais são um bem comum – mesmo aqueles que não são católicos mas que são regionalistas – têm o bem comum de agarrar as pessoas que estão no estrangeiro e que assinam jornais só porque falam da sua terra. Além disso, a dimensão de ligação às raízes é muito importante e mesmo sob esse aspecto arriscava o dinheiro público precisamente para que se dignificasse e, de alguma forma, se tornasse mais honroso o nome de Portugal.

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