O amor é difícil. Pedindo emprestado o título português dado a Lost in Translation, poderíamos acrescentar que o amor é um lugar estranho, onde cada um não consegue resistir a querer perder-se de vez em quando. Sem coordenadas que nos guiem, o amor é uma viagem de enorme risco, sem garantias de que, no fim, se consiga encontrar o que se procurava, mas que o Homem (assim, com letra maiúscula), teimoso como é, continua a querer sempre empreender. Desde sempre. Para alguns uma estupidez, para outros a única forma de vida. Para Mike Nichols, o realizador de Closer – Perto Demais, certamente que não deve ser fácil de optar entre as duas hipóteses.
Por este seu mais recente trabalho, e atenção que Nichols já anda nisto desde os anos 60, quando se estreou no cinema com Quem Tem Medo de Virginia Woolf?, passam duas visões distintas da arte suprema de amar. Entre o deslumbramento, paixão e todas as cores do arco-íris, para logo a seguir, sem aviso, fazer paragem por todos os lados mais sombrios de qualquer relação. As elipses que nos proíbem a visão completa dos momentos críticos dessas várias ligações aqui existentes, só vêm ajudar a que cheguem até nós na sua máxima força, permitindo descobrir ao mesmo tempo das personagens os motivos para os seus sofrimentos futuros.
Filme de actores e para actores, a palavra vale aqui mais que mil imagens, com as origens teatrais do realizador sempre bem vincadas. A câmara quase sempre a uma distância de segurança que permite o vaguear ligeiro do espectador, em busca do que mais lhe interesse. São quatro as personagens deste filme. Dois e duas. Que se cruzam e descruzam, numa sucessão de acontecimentos que não deixam espaço para que nos cheguemos a aperceber de quão poucas pessoas este filme vive. São quatro. Durante o filme todo. Não há sequer espaço para secundários. Não são precisos. O amor é sempre solitário. Mesmo que sejam sempre precisas duas pessoas: para se amar e ser amado.
Sendo um filme de e para actores, estes não esquecem tal, e encontram-se quase todos eles ao seu mais alto nível neste filme. E se para cada regra há uma excepção, Jude Law surge aqui a provar isso mesmo. Já aquando do seu papel em Sky Captain aqui foi dito que Law é um dos mais fracos actores da actualidade, onde apenas em filmes como o recente Alfie, pelo registo e tom ligeiro que lhe era pedido, tal defeito é disfarçado, mas em Closer tais fragilidades ficam de novo visíveis, não ajudando nada que todos os outros actores apareçam aqui a um nível elevadíssimo. Julia Roberts com o seu sempre presente sorriso de Mona Lisa, dos mais enigmáticos em Hollywood, está cada vez melhor, não deixando de estar igual a ela própria, o que irá certamente irritar uns quantos. Dos considerados secundários, pelo menos nos Globos de Ouro assim foi, onde arrebataram ambas as estatuetas, Natalie Portman apenas vem provar a urgência do grande salto para papéis maiores, e Clive Owen, que recentemente fez de Rei Artur, e quase esteve para ser o novo Bond, James Bond, não deixa qualquer espaço a Law durante todo o filme.
O amor, como se refere no início deste texto, é difícil. Em Closer, no fundo, fica apenas uma pequena amostra de todas as dificuldades que um novo viajante desprevenido, nesta aventura, pode vir a encontrar. Entre enganos e recuos, Mike Nichols assina um filme que não chega a ser bom, mas que ainda assim tem bons momentos. Tal qual uma relação, também ela feita de altos e baixos. No fim, mesmo quando apenas vemos os lados menos positivos, é impossível dizer que não valeu a pena.
The Gift
Até hoje o Corta! sempre escreveu em exclusivo de cinema, mas, mais cedo ou mais tarde, surgiria um motivo suficientemente forte para que tal exclusividade fosse quebrada. Os The Gift tocam este sábado no Fundão. E só apenas para quem os não conheça achará estranha esta referência musical num espaço de cinema. O cinema para os Gift foi muitas vezes ponto de partida para a sua música, quando não mesmo ponto de passagem ou chegada. A não perder!
Por: Hugo Sousa
cinecorta@hotmail.com