A Guarda presta durante todo o mês de Fevereiro um tributo a sete artistas populares do concelho. Criativos e talentosos, misteriosos ou encantadores, autodidactas todos, Maria Barraca, Amélia Agostinho da Costa, Guilhermino Carvalhinho, Álvaro de Carvalho, Sofia Pinto, Rosa Carrilho e António Ferreira mostram a sua arte peculiar e simples e revelam-se a si próprios. Esta exposição colectiva intitulada “Mãos que Voam”, promovida pela autarquia local, assenta arraiais no Paço da Cultura e vai ser inaugurada ao final da tarde de hoje.
Inédito é o facto da iniciativa reunir objectos pessoais e elementos biográficos para que os visitantes possam saber mais sobre cada um deles e entender melhor algumas das suas peças, expostas nas galerias do Paço. De regresso está Maria Barraca, da Mizarela, e os seus famosos Panos de Santa Bárbara, uma colecção propriedade do Centro Cultural de Famalicão da Serra. A sensibilidade e fantasia de uma mulher obcecada com a vida da santa-mártir deu origem a bordados de espanto e loucura que já correram o país. O imaginário e a fé são aqui a fonte de inspiração de panos coloridos sobre os episódios da vida de Santa Bárbara. Também influenciada por sentimentos religiosos, Amélia Agostinho da Costa retrata, na entretela e com linhas normais de cores variadas, imagens do Senhor e dos Santos como só a sua imaginação e coração vêem. Guilhermino Carvalhinho faz-nos, por sua vez, descer do reino celeste para o terreno com as suas obras telúricas e estranhas em raízes de torga. São “monstros” enigmáticos de garras e focinho ameaçadores, dignos de alguns pesadelos, idealizados e esculpidos por um autodenominado artesão da Natureza. Guilhermino Carvalhinho nasceu em Manteigas mas vive na Guarda há várias décadas. Descobriu o “dom” quando passava uns dias de férias no Vale do Rossim onde uma enorme raiz de torga lhe lembrou de imediato um bicho estranho.
Já Álvaro Carvalho escolhe os temas do mundo rural, como a ordenha ou a tosquia, reproduzidos em barro para enaltecer a riqueza artística e cultural de uma vivência em vias de se perder. Para além de fixarem actividades agrícolas, as suas mãos têm ainda o mérito de imortalizar o suor, a labuta e a dignidade de quem trabalha o campo numa homenagem simples em pequenas figuras de barro. Lugar ainda no Paço da Cultura para as “mulherzinhas” de Sofia Pinto, natural da Guarda. Elaboradas com uma massa secreta, estas estatuetas surpreendem pelas suas dimensões reduzidas e paleta cromática. Numa escala maior, Rosa Carrilho, natural do Soito, junta-lhes presépios e figuras religiosas em barro. São anjos, meninos em palhas deitados, senhoras e homens que velam. A sua vocação revelou-se em 1996, após um curso de cerâmica no Porto. O que também foi o caso com António Ferreira. Famoso pelas suas albardas em miniatura, este artesão de Famalicão da Serra foi apurando a arte de trabalhar a madeira nos intervalos dos trabalhos agrícolas, conseguindo actualmente figuras religiosas ou pagãs de grande expressividade. Mais conhecido por António “Albardeiro”, nasceu em Vila Verde há 65 anos mas reside em Famalicão, no concelho da Guarda, desde a sua infância. Há sete anos que não perde uma oportunidade da Natureza para esculpir pedaços de vime, oliveira ou carvalho. A Câmara da Guarda aproveita ainda esta exposição para editar o caderno “Mãos que Voam”.
Luis Martins