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40 anos depois…

Agora Digo Eu

40 anos depois e o 25 de Abril tem de manter viva a chama da Liberdade para que os cravos possam continuar vermelhos.

40 anos depois levanta-se o véu e vemos práticas do mais feroz e reacionário onde os detentores do poder aplicam, a seu bel-prazer, os frios cifrões do capitalismo que atingem as camadas mais jovens. O desemprego uma infeliz realidade. Os políticos, gestores e banqueiros num regabofe vergonhoso. O rendimento baixou tanto que fomos alcançados por países do leste europeu e onde a pátria de Camões regista atualmente 2 milhões de pobres, 2 milhões de reformados, com a reforma mínima e ainda mais 2 milhões a viverem do salário mínimo ou um pouco acima dele. Uma classe média em completa extinção. Os piores vencimentos, reformas, segurança social e saúde, num atropelo constante aos direitos de quem trabalha.

Os jogos de poder são um misto de mentira, cinismo e hipocrisia, neste crescente processo de falência social, numa aposta imoral de apoio aos grandes e poderosos onde a insensatez, a insensibilidade, a arrogância, a subserviência aos proxenetas internacionais, a falta de princípios e valores são uma evidência. A crise é utilizada para contestar tudo e todos, utilizando-se táticas de guerrilha ao considerarem as pessoas números, camuflando-as em operações de cosmética, dando a entender que o Estado quer cada vez menos assumir o papel social, privatizando o que pode dar lucro, entregando à gula do grande capital financeiro, nesse processo materialista onde se mistura riqueza com pobreza, guerra com paz, inteligência com calculismo, submissão do poder político ao económico.

Não foi para isto que se fez o 25 de Abril.

E é aqui que entram os dois princípios conhecidos, havendo necessidade de assumir dúvidas, diferenças, utopias e contradições de um conceito. De um lado o idealismo, espiritualista, que segue sem atender à parte material da vida, com olhos postos em teorias, algumas dogmáticas, tão bem simbolizado pelo famoso Cavaleiro de La Mancha. Do outro, no revés da medalha, olhemos para o ato governativo, saltando por cima de todo e qualquer princípio, declara tudo utópico, aplica a ordinária e manhosa política de ricos e pobres, ficando muito bem representado pela rotunda, anafada e estúpida figura do papão Sancho Pança.

40 anos depois e aqui temos um Cavaco na Presidência da República (eleito por um quarto da população), uma segunda figura de Estado “sem problemas”, um primeiro-ministro impreparado e um governo que é um desgoverno para o povo e uma bênção para os exploradores de sempre, curiosamente todos eles fruto do 25 de Abril. Engraçado não é… Coisas da revolução que a História um dia analisará.

Abril prometeu e cumpriu. Descolonizou. Desenvolveu, Democratizou, Criou uma sociedade aberta e pluralista onde cabem todas as motivações, paixões e emoções, tão bem descritas e cantadas por poetas e trovadores. Para lá dos 40 anos de vida, há 400 conceitos, 4.000 conquistas, mais de 14.000 de liberdade. Abril deu liberdade de dizer, de ouvir, de ser. Atingiu-se a expressão livre de sentimentos ao cortar-se as amarras da opressão, do obscurantismo, da estupidez, percebendo-se que (ainda) é possível a igualdade de oportunidades.

40 anos depois e todos vamos comemorar. Todos (ou quase) irão colocar um cravo na lapela do casaco. Uns, fá-lo-ão por convicção. Outros, por obrigação. Talvez, apenas e só, pela defesa do tacho. A esses que não entendem o significado do cravo rubro/revolução, o poeta dedicou-lhes quatro linhas. «Cravo vermelho ao peito/ A todos fica bem/ Sobretudo dá jeito/ A certos filhos da mãe».

40 anos depois e os militares de Abril não irão estar na sessão solene na casa da Democracia por recorrente mau comportamento e educação da sua presidente, eleita em segunda escolha, com os votos exclusivos da direita. Pois é: «Não podemos deixar que os nossos carrascos nos criem maus costumes».

Citando novamente Simone de Beauvoir: «Que nada nos defina. Que nada nos sujeite. Que a Liberdade seja a nossa própria substância».

40 anos depois… 25 de Abril, sempre.

Por: Albino Bárbara

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