Não vi a reportagem “Planeta plástico” deliberadamente. Fui fazendo zapping para aqui e para ali até que as imagens impressionantes de um planeta a afogar-se em plástico terminaram. De facto, há muito que tenho conhecimento deste problema, ou não andassem as organizações ambientalistas a alertar para ele desde o século passado. Mas muito poucos lhes têm dado ouvidos. Por isso, reconheço que reportagens como esta, nos noticiários de estações televisivas em horário nobre, podem ter um maior alcance e impacto na opinião pública. Mas, num planeta embalado em plástico, o que pode um simples cidadão fazer para inverter o rumo das coisas?
A simples ida a um supermercado é hoje um jogo de ultrapassagem de obstáculos plásticos: a fruta vem em sacos de plástico, os detergentes em embalagens de plástico, os dentífricos em bisnagas de plástico escondidas em embalagens de cartão, os sumos em garrafinhas de plástico, a água em garrafões de plástico, o peixe dentro de três sacos plásticos para não escorrer e, no fim de contas, mais umas quantas sacas de asas (de plástico) para carregar tudo até ao carro. Alguém já tentou entrar num supermercado com sacos de pano para a fruta, recipientes de vidro para o fiambre ou uma bacia de alumínio para trazer o peixe? E tudo dentro da grande seira de junco herdada da avó? De certeza que, numa ou noutra etapa desta difícil tarefa de arranjar comida para a família, para além dos olhares dos outros clientes, a coisa mais provável que nos pode acontecer é uma longa argumentação com o gerente. Embora já faça muitas compras em novas mercearias onde tudo, mas mesmo tudo, se apresenta a granel e onde o plástico não entra, o contentor amarelo lá em casa, que infelizmente é de plástico, é sempre o primeiro a encher. No entanto, nunca desisto de optar por alternativas naturais, biodegradáveis e com uma pequena pegada ecológica.
Com esta filosofia, há anos que procurava cadeirões de jardim. No entanto, só encontrava plástico nas mais variadas cores e formatos: quem é que, logo no início da Primavera, não passeou por hipermercados, centros de jardinagem e lojas de móveis e não se deparou com enormes torres de cadeiras de plástico? E de mesas, e de bancos, e de espreguiçadeiras, e de flores e – pasme-se! – de relva, tudo vindo do outro lado do planeta e a preços inacreditáveis. Mas, quando a esmola é muita, o consumidor informado só tem de desconfiar.
Isto tudo para dizer que, na sequência destas férias de 2020 na Guarda e de uma ida ao centro comercial La Vie, onde admirei uma exposição de cestaria, foi com bastante agrado que descobri em Gonçalo dois ou três artesãos que ainda trabalham o vime e lhe dão as mais variadas, belas e incríveis formas: cestos, tabuleiros, mesas e, claro, cadeiras e cadeirões de jardim. Foi uma tarde bem passada nesta aldeia tão hospitaleira, mas, infelizmente, vim de lá com um amargo de boca. Segundo me informaram, é uma arte em extinção, pois não há interesse, não há formação, não há incentivo que possa manter (e melhorar) esta arte nas próximas gerações. Para ser franca, não quero acreditar muito nos meus interlocutores, pois de qualquer autarquia, com uma joia destas na mão, outra coisa não se pode esperar do que programas de formação e de incentivo. E mais de uma autarquia como a da Guarda, com um riquíssimo património bem conservado e uma sustentabilidade que salta à vista! Mesmo as escolas devem ter um papel importante na preservação desta identidade de Gonçalo, proporcionando às crianças e jovens oportunidades para trabalhar e experimentar o vime. E até os consumidores, com o seu poder de escolha ou de embargo, têm um papel relevante em todo este processo.
Caso contrário, vamos continuando a comprar plástico. E a arruinar a saúde do planeta.
Fátima Bica, de férias na Guarda